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José Prata: O PT é atualmente um “gigante de pés de barro”. Mudança urgente!

O PT é uma construção histórica de baixo para cima, a partir dos movimentos sociais e das lutas políticas nas cidades brasileiras, onde construímos as administrações populares, inclusive em Contagem. Mas o PT é hoje, infelizmente, um “gigante com pés de barro”. Nosso Partido é um “gigante” no plano nacional, tem a presidência da República, tem quatro governos de Estados, ainda que todos em uma única região, o Nordeste (Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte e Bahia); tem nove senadores; tem 184 deputados e deputadas (68 federais e 116 estaduais).(…) Mas, nas cidades, no “chão do Brasil”, o PT é “quase nanico”: elegeu apenas 182 prefeitos em 2020 e agora, com a janela partidária, chegou a 265, avanço, contudo, ficou concentrado nos estados do Ceará, Piauí e Bahia –todos comandados por governadores petistas. O PT, mesmo com o crescimento com a filiação de novos prefeitos, é “quase nanico” sendo apenas o 9º dentre os partidos em número de prefeitos. Nas Câmaras Municipais também o PT é “quase nanico” e elegeu apenas 2.700 vereadores, o que representa 4,6% do total; nosso Partido é apenas o 9º colocado no número de vereadores. Ainda nas Cidades, os movimentos sociais, muito potentes no passado, hoje estão enfraquecidos, sem rumo e com pequena capacidade de mobilização. Os atos realizados recentemente – tentativa de responder aos atos de Bolsonaro e o 1º de maio-, foram decepcionantes: na maioria das grandes cidades não teve público sequer de 1.000 pessoas. Esta fragilidade mostra a necessidade de uma “mudança urgente” no PT. É preciso “cair a ficha”, como se diz, de nossas lideranças partidárias.(…) Dois textos publicados recentemente, um do companheiro Ivanir Corgozinho, publicado no Blog do Zé Prata e do Ivanir, denominado “Se me ferirem viro fera”. A radicalidade universalista de Marília Campos” e outro publicado no jornal O Tempo, denominado “Sábia Marília”, do colunista Paulo Diniz Filho, mostram a potência do projeto petista de Contagem, liderado pela prefeita Marília Campos. Projeto este estruturado em torno do “humanismo universalista”, como linha de conduta política e filosófica, de grande capacidade de aglutinação popular, e a proposta de “reconstrução do PT de baixo para cima, no “chão do Brasil”, em nossas Cidades”. São destes dois eixos da esquerda que trato neste artigo.

O PT JÁ FOI MUITO FORTE NOS MUNICÍPIOS, MESMO DEPOIS QUE CHEGOU A PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA COM LULA E NO INÍCIO DO GOVERNO DILMA. Paulo Diniz Filho, em seu artigo, afirma: “A questão municipalista apenas ocupou corações e mentes petistas enquanto o partido comandava prefeituras, mas ainda não tinha conquistado a Presidência da República. Na década de 1990, falava-se no “jeito petista de governar” como sinônimo de inovação na gestão das cidades – discurso e prática que foram rapidamente abandonados após a chegada de Lula ao poder, em 2003”. O colunista acerta quando relembra a importância que teve na história do PT o “jeito petista de governar” as cidades, mas erra em debitar o quase abandono da agenda municipalista à chegada do PT à presidência da República. Não é bem assim. O PT, com Lula, em seus dois primeiros governos, atingiu o auge de conquista de prefeituras e de vereadores em todo o País, inclusive no caso de Contagem, em 2004 e 2008.(…) Nosso Partido tinha 409 prefeitos(as), em 2004, saltou para 558, em 2008, terceiro maior partido nos municípios atrás apenas do MDB e PSDB, e teve seu melhor desempenho, em 2012, com 638 prefeitos, de novo na terceira colocação atrás, mais uma vez, do MDB e PSDB. Veja só: PT e PSDB revezaram na primeira e na segunda colocação, durante 16 anos, no número de prefeituras nas grandes cidades. Em 2000, o PT tinha 22 prefeituras de grandes cidades e o PSDB 18; em 2004, o PT manteve a hegemonia com 21 a 20; em 2008, o PT disparou com 25 a 14 (o MDB despolarizou e fez 21 prefeitos nas grandes cidades); em 2012, PT elegeu 18 prefeitos nas grandes cidades e o PSDB elegeu 19.(…) Nas eleições municipais seguintes, o PT virou um partido “quase nanico” nos municípios. Em 2016, o PT encolheu de 638 para apenas 254 prefeitos e, em 2020, recuou ainda mais para apenas 183 prefeitos, ficando apenas na 11ª colocação dentre os partidos brasileiros. E mais grave ainda: a esquerda, sobretudo o PT, recuou muito desde 2012 no número de prefeitos, com destaque para o recuo nas grandes cidades. Em 2016, o PSDB conquistou 29 grandes cidades e o PT foi massacrado ficando apenas com 1; em 2020, o PT teve uma tímida recuperação, com a conquista de quatro cidades (Contagem, Juiz de Fora, Diadema e Mauá). Com menos prefeitos e, sobretudo com a perda das grandes cidades, desabou o número de pessoas governadas pelo PT; em 2020, o PT passou a governar apenas 6.045.238 pessoas (2,9% da população brasileira). O PT viu também sua representação nas Câmaras Municipais desabar nas duas últimas eleições. Nosso Partido atingiu força máxima nas eleições de 2012, quando elegeu 5.200 vereadores e vereadoras em todo o Brasil; nas eleições de 2020, a representação do PT nas Câmaras Municipais foi reduzida para quase a metade, apenas 2.700 vereadores.(…) Como se vê não foi a chegada à presidência, com Lula, em 2023, que afastou o PT de uma agenda municipalista. Com Lula, nos dois primeiros mandatos tivemos, disparado, os melhores resultados nas prefeituras e Câmaras Municipais. Isto porque, Lula tinha uma enorme empatia com os municípios e com os prefeitos: ampliou políticas sociais de enorme impacto nos municípios; municipalizou a implementação do PAC, grande programa de obras em todo o Brasil; as receitas municipais cresceram de forma substancial com o crescimento da economia de 4% ao ano; Lula sempre recebia os prefeitos e marcava presença nos encontros deles em Brasília, e isto permaneceu no governo Dilma até 2012. Não acredito que o quase abandono da agenda municipalista tenha sido em função do “DNA centralizador” a que se refere o colunista Paulo Diniz Filho.(…) Desde 2012, provavelmente em função dos enormes ataques sofridos e em função da prioridade para a defesa de um projeto nacional e de nossas lideranças, o PT priorizou, de forma quase absoluta, o projeto nacional em detrimento da agenda municipalista, tendo como consequência a perda muito ampliada de suas bases municipais. Mas, verdade seja dita: o que deveria ser algo emergencial, a priorização quase absoluta da agenda nacional, se transformou em algo permanente. Tivemos uma importante vitória com esta estratégia, que foi a vitória de Lula para presidente, mas temos hoje um partido “gigante” mas com “pés de barro”. Considero esta situação insustentável. Mesmo, com Lula, a reeleição em 2026 não está garantida; corremos um sério risco no Congresso Nacional, com o Centrão consolidando amplamente a hegemonia na Câmara dos Deputados, superando na prática o presidencialismo de coalizão e implantando o semipresidencialismo, e a extrema direita em aliança com setores radicais dos partidos de centro assumirem a maioria no Senado. Este abandono da agenda municipalista é um erro, perdemos bases nos municípios em 2016, em 2020 e agora, em 2024, a nacionalização das eleições apenas esconde as enormes fragilidades do PT e de toda a esquerda nos municípios e as pesquisas mostram um quadro dramático de nossas candidaturas nas médias e grandes cidades.

A CONSTRUÇÃO DO PT NO “CHÃO DO BRASIL”, NAS NOSSAS CIDADES, É QUE GARANTIRÁ OS AVANÇOS POLÍTICOS E SOCIAIS NO BRASIL. A linha política que adotamos em Contagem é muito diferente daquela adotada pelo PT Nacional e pelo PT Minas. Nossa linha política é tida como “despolitizada” e “provinciana”; mas isso é um grave erro até porque temos uma enorme tradição de politização com formulações, textos e livros sobre os rumos de nosso Estado e de nosso País. Somos contra a nacionalização da disputa eleitoral, vamos centrar nosso combate político naquelas questões concretas de nosso município. Impressionante: o petismo em todo o Brasil tem um discurso homogêneo para todos os locais: seja no Brasil, nos Estados, nos municípios, na Igreja, na família, no local de trabalho. Isto não deu certo no passado nem vai dar certo nas eleições deste ano. É preciso resgatar a história da construção de nosso Partido. O PT é um partido criado de baixo para cima, a partir das lutas sociais, teve também nas primeiras décadas de existência uma forte presença no “chão” de nosso País, que são as cidades brasileiras. As administrações populares em grandes cidades foram fundamentais para a nacionalização da forma petista de governar, que, mais tarde, chegou também aos governos de Estado e a presidência da República. É preciso retomar este processo de construção de baixo para cima.(…) O PT precisa deixar de subestimar a agenda política municipalista. Muitos dizem, com razão, que se não é possível “nacionalizar as eleições municipais”, o inverso também é verdade: não se consegue “municipalizar a eleição presidencial”. Podemos ter maus resultados nas eleições municipais, como em 2020, e elegemos Lula presidente; podemos ter de novo desempenho ruim nas eleições deste ano de 2024 e Lula continuará a ser uma candidatura muito competitiva e até favorita nas eleições de 2026. Mas o impacto dos prefeitos e vereadores na dinâmica nacional é muito grande; se eles não elegem o presidente, eles são cabos eleitorais decisivos para a eleição de deputados federais que podem ampliar ou limitar a agenda política do presidente da República. Estudo realizado por Felipe Nunes, da Quaest, divulgado na Globo News, mostra isto. O cientista político afirmou que PL e PT elegem muitos deputados “sem precisar de prefeitos e vereadores”; mas o desempenho dos partidos do Centrão na eleição de deputados federais “praticamente repete a votação para prefeitos e vereadores”.(…) O ministro Alexandre Padilha afirma que tivemos no Brasil, com Temer e Bolsonaro, o “presidencialismo de delegação”, com a entrega da gestão do governo ao Centrão, e que Lula estaria reconstruindo o “presidencialismo de coalizão”; é muito duvidoso esta linha de raciocínio, ou seja, tudo indica que o Centrão será o grande vitorioso das eleições municipais, PT e PL terão resultados modestos em minha opinião, e, com isso, os partidos de centro irão aumentar a pressão política pelo controle do governo visando as eleições de 2026.

PAULO DINIZ FILHO APONTA QUE A RETOMADA DA CONSTRUÇÃO PARTIDÁRIA NOS MUNICÍPIOS, PROPOSTA PELA “SÁBIA MARÍLIA”, PODERÁ SER DECISIVA PARA A SOBREVIVÊNCIA DO PT COM A APOSENTADORIA DE LULA. É interessante ver palavras encorajadoras às nossas práticas políticas em Contagem vindas de um colunista de centro: “Pesquisas de intenção de votos divulgadas por O TEMPO apontam que Marília Campos, prefeita de Contagem, caminha para ser reeleita com facilidade em outubro. Segundo o DATATEMPO, Marília contaria com 59,4% dos votos válidos caso a eleição fosse realizada no momento atual. Não se podem reputar tais números à simplória rivalidade entre esquerda e direita: segundo os dados da pesquisa, Marília herda 37,4% dos votos que Jair Bolsonaro conquistou em Contagem no pleito de 2022. Mas o aspecto político de Marília Campos a ser destacado na presente análise não se relaciona com seus números pré-eleitorais. Em recente entrevista, e sem querer criar polêmica, Marília Campos se queixou de que o PT, seu partido há décadas, não vem prestando a atenção necessária às prefeituras. Desenvolvendo o argumento, Marília afirmou que o PT tem mais interesse em pautas nacionais – temas genéricos que, mesmo guardando importância intrínseca, pouco contribuem para ajudar quem faz a gestão das cidades. Esse breve diagnóstico foi prontamente rechaçado por lideranças partidárias, como era de esperar. Essa mudança de foco deveria pautar as discussões partidárias, principalmente porque pode ter contribuído para a drástica queda no número de cidades governadas pelo PT em Minas. Talvez esse vício explique a persistência de temas nacionais em todos os debates em que há candidatos petistas. A sábia Marília Campos, em sua breve pontuação, pode ter tentado apontar a questão da sobrevivência do PT após a aposentadoria de Lula, quando o partido vai depender dos prefeitos para produzir novas lideranças. Mas, como ocorre com a maioria dos sábios, pouca gente quis compreender sua mensagem”. Mas como diz o Ivanir em seu artigo sobre Marília: se os sábios e sábias, como Marília, são tratados muitas vezes com indiferença, são eles que continuarão a ser escolhidos para “liderar as grandes batalhas”, no caso nosso para as eleições majoritárias nas grandes cidades, e nas eleições majoritárias para o Senado, governadores e presidente da República.(…) Tenho um diálogo com muitos nomes das ciências políticas e intelectuais de Minas com projeção no Brasil, para os quais remeto regularmente nossas produções política e publicitárias. Numa destas conversas escrevi para meu interlocutor: “A derrota do extremismo, em minha opinião, deve ser de baixo para cima, no chão do Brasil, em nossas cidades. Contagem pode virar um exemplo para o Brasil. Marília está inspiradíssima e pode liderar este grande combate democrático”. Meu interlocutor me respondeu: “Não há outra opção. É na base que se muda a história. As vitórias nacionais acabaram encastelando lideranças, que se afastam do povo. Um perigo! Sorte a nossa de ter a Marília”. Diálogo maravilhoso e encorajador!

IVANIR CORGOSINHO: MARÍLIA ENCARNA O UNIVERSALISMO HUMANISTA EM SUAS POSIÇÕES POLÍTICAS E FILOSÓFICAS E EM SUA TRAJETÓRIA DE VIDA. Em um ótimo artigo publicado no Blog do Zé Prata e do Ivanir, o companheiro Ivanir Corgosinho produziu um texto maravilhoso sobre a prefeita Marília Campos. Sempre dediquei, ao longo dos anos, um enorme esforço para entender a figura Marília Campos e seu enorme potencial político e organizativo. Me dediquei mais à Marília enquanto líder política, e, neste sentido, produzi um texto que considero “definitivo” para a minha capacidade de compreensão na parte inicial da revista “Contagem está feliz com Marília”, o que levou minha mulher às lágrimas quando ela leu a publicação. Agora, o Ivanir escreve sobe uma outra dimensão da Marília, mais transcendental, a Marília vista de um ponto de vista filosófico. Marília ao ler o texto não chorou, ela “perdeu o fôlego”. Provavelmente o texto do Ivanir vai marcar a vida da Marília para sempre, uma liderança do “universalismo humanista”. Para o autor uma marca da Marília é a luta pelo bem comum: “No caso da prefeita Marília, o propósito previamente estabelecido que ela cultiva e que a sustenta no esforço para compor pactos e construir consensos é o bem comum. Marília tem um compromisso taxativo e inarredável, atestado por sua biografia, com um projeto humano universal e com a inclusão social como meios para a promoção do desenvolvimento e do bem-estar coletivo. Este compromisso está filosoficamente incrustado na base de sua visão de mundo, nas relações que estabelece com os moradores da cidade, na sua luta contra privilégios e é, ademais, o que orienta o programa de governo desenvolvimentista e inclusivo que propõe para a comunidade. Trata-se de um compromisso que guarda laços profundos com a identidade que a prefeita mantém com a cidade e seus moradores, assim como manteve, no passado, com outras comunidades. Aqui, é possível evocar o que o filósofo contemporâneo canadense, Charles Taylor, chamou de “ética da autenticidade”, referindo-se à busca por um autêntico que não se pretende original ou inédito, mas, isto sim, se assume como verdade socialmente produzida e legitimada pela influência da vida comunitária e das relações interpessoais na formação da identidade pessoal. Um autêntico que, portanto, se pretende expressão fiel da vida como ela é, e não um simulacro produzido pelas convenções sociais ou pela política profissionalizada. Em suma, não há nada de monárquico, messiânico, redentor, artificial, publicitário e, enfim, unilateral, na liderança de Marília. As lutas de seu povo são suas lutas e as lutas que, por ventura, ela propõe ao povo, visam o melhor interesse da comunidade. Além disso, Marília tem a consciência que seu “trono” é passível de crítica e concorrência. Por essa razão, ela não teme, nem se sente desconfortável, com o conflito. Ao contrário, até o incentiva. Marília não hesita em apontar publicamente falhas de seu próprio governo e estimula a auto-organização da população para que reivindique suas demandas junto à administração – atitude que, por vezes, pode exasperar seus auxiliares”.

O humanismo é uma das mais generosas correntes filosóficas já inventadas. Ivanir fala em seu texto do universalismo humanista: “Não é de hoje, o universalismo e a ideia de comunidade estão sob forte ataque, ao mesmo tempo que ocorre um extenso processo de fragmentação competitiva das relações sociais. Estes fenômenos são decorrentes do advento da chamada globalização, aliada ao neoliberalismo como política econômica. A globalização encurtou distâncias, diluiu fronteiras simbólicas e geográficas, dissolveu velhas identidades e deu margem à expansão da diversidade e do multiculturalismo numa escala jamais imaginada pelas revoluções liberais, às quais devemos o início desta abertura. Ao mesmo tempo, o neoliberalismo impôs um acirramento impiedoso da concorrência entre os agentes econômicos na luta pelo aumento de suas margens de ganhos e de sua participação na repartição da riqueza socialmente produzida. Em consequência, em lugar de perspectivas ampliadas e ecumênicas nos relacionamentos, de forma a potencializar as possibilidades criadoras da pluralidade dos modos de ser, passamos a conviver com o acirramento da hostilidade entre os grupos numa dinâmica que tem levado à percepção do “outro diferente de mim” como um inimigo perigoso, e não como mero adversário, competidor ou, quem sabe, um parceiro. Evidência deste fenômeno é a radicalização da preferência das pessoas por se relacionarem apenas quem pensa da mesma forma, encapsulando-se em “bolhas de opinião confirmativas”. O grande problema é que o “espírito de confraria”, o “paroquialismo” e o “corporativismo” que, fatalmente, emergem desse tipo de comportamento, passaram a ser incensados como um tipo de “tribalismo” ou “identitarismo” válidos na disputa por direitos e prerrogativas. Assim, cada vez mais, indivíduos e grupos se veem como portadores de identidades claramente definidas e só se identificam com quem seja da mesma tribo, declarando-se hostis aos demais. Ora, este é o fim do universalismo humanista. O humanismo é uma das mais generosas correntes filosóficas já inventadas. Coloca a dignidade do ser humano no centro de suas preocupações, realçando a igualdade dos indivíduos uns perante os outros, e rechaça, por esta mesma razão, toda forma de obscurantismo, autoritarismo e opressão, defendendo a tese pela qual as hierarquias, como construções humanas, podem ser mudadas e até eliminadas. Já o universalismo é uma ideia fundamental para a promoção da justiça social ao afirmar que ninguém deve ficar às margens do progresso, pouco importam suas origens de classe, seu sexo, etnia, credo, etc. Ambos, o universalismo e o humanismo, são princípios éticos que informam as noções de bem e de justo, sem as quais não é possível um programa de ação que promova a busca da felicidade por todos e por cada um”.

O PT precisa, de forma desesperada, de grandes lideranças universais para as grandes batalhas. O Ivanir termina o seu artigo defendendo o resgaste do universalismo humanista: “Não há escapatória para a humanidade. Somente uma ética de alcance universal, fundamentada nos princípios iluministas de liberdade, igualdade e solidariedade construídos no decorrer de séculos que remontam aos velhos gregos e ao cristianismo primitivo, poderá fazer convergir a multiplicidade humana numa mesma “casa comum”. Nesta caminhada, é inevitável, lideranças como Marília continuarão a ser escolhidas por seus pares para liderar a grande batalha. “Ave Caesar, morituri te salutant” (em tradução literal, “Ave, César, aqueles que vão morrer o saúdam”, conforme a Wikipédia).(…) Dentre as grandes batalhas que temos pela frente se destacam: as eleições para prefeituras de grandes cidades, para o Senado, para governadores e para a presidência da República. E é este um dos maiores desafios atuais do PT, faltam lideranças universais competitivas para as grandes disputas majoritárias. Uma mudança expressiva na nossa representação parlamentar é que, no passado, nossa representação parlamentar, era vinculada mais à velha guarda do PT, foi construída nas lutas sociais e eram mais universais; com isso eram os potenciais prefeitos e prefeitas nas médias e grandes cidades e candidatos fortes ao governo dos Estados, e, eleitos, abriam espaço para a subida de nossas lideranças que eram suplentes e, assim, o Partido se renovava permanentemente. Hoje, nossa representação parlamentar, pouco vinculada às disputas municipais, são representativas de segmentos sociais, grupos identitários, e com votação muito fragmentada nos estados. O que impressiona é que temos 68 deputados federais e 118 deputados estaduais, num total de 184 parlamentares, quase todos com domicílios eleitorais em cidades médias e grandes, e poucos são candidaturas competitivas para as mais importantes prefeituras do Brasil. Por isso a situação do PT na eleição deste ano é tão complicada: temos poucos prefeitos numa situação que a tendência é de continuidade nos municípios; temos muitos deputados mas que são candidaturas pouco competitivas nas grandes cidades; e não se cria lideranças potentes e universais da “noite para o dia”.

Ninguém entra na política já pronto politicamente, com perfil, por exemplo, do universalismo humanista, ele(a) se torna a partir a partir dos desafios e das escolhas da vida. Marília fez uma transição muito interessante de sindicalista para o cargo de prefeita de Contagem; uma trajetória muito parecida com a de Lula. Foi sindicalista e presidenta do Sindicato dos Bancários e depois ocupou por duas vezes o mandato executivo, como prefeita de Contagem e, agora, foi eleita para um terceiro mandato. Um balanço indica claramente que os movimentos sociais, em geral, são mais radicais, mas também, por representarem interesses concretos de segmentos da sociedade, são mais corporativos. Já no Poder Executivo, os administradores de esquerda, em geral, são mais moderados, mas, tendo que atender demandas de toda a sociedade, são também mais universais. Marília se dedicou com muita garra à luta dos bancários por melhorias salariais, emprego e por planos de saúde e de Previdência, auxílio-alimentação e creche; mas na Prefeitura teve que avançar para uma visão mais universal, para atender demandas de saúde, educação, urbanização de toda a população. Ou seja, Marília, como Lula, era mais radical como sindicalista. Como prefeita, ela é mais moderada mas também é uma líder política mais universal. Não existe contradição insolúvel da Marília sindicalista e prefeita. São dois espaços importantes da luta social. É verdade que sindicatos não podem submeter os interesses das categorias aos governos, mesmo de esquerda. Mas é verdade também que nenhum governo pode governar apenas para os filiados de sindicatos. Por isso mesmo dizemos: nem sindicalismo governista nem governo sindicalista.

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