Como todos e todas sabem a origem de toda a polêmica em torno da recuperação fiscal de Minas Gerais é um texto de 92 páginas que publiquei recentemente. Infelizmente, os dirigentes do PT Minas distorcem o debate afirmando que eu, Marília e Reginaldo estaríamos defendendo a recuperação fiscal com base nos critérios de Romeu Zema. Isto não é verdade. Estou solicitando aos dirigentes do PT que leiam o que eu escrevi e não adotem a fórmula “não li e não gostei” e que mandem a análise com grifos daquilo que discordam. Afirmo categoricamente: não acharão uma única frase de apoio à recuperação fiscal de Zema. Está na capa do meu documento: “É preciso aproveitar a presença de Lula na presidência da República e aprovar um “Plano de Resgaste” de nosso Estado, sem privatizações, sem congelamento dos servidores, sem destruição dos serviços públicos e com uma redução expressiva da dívida do Estado”.
VEJA NOSSO DIAGNÓSTICO DRAMÁTICO DA FALÊNCIA DE MINAS GERAIS. Minas Gerais “sangra” há 30 anos com uma crise financeira que não tem fim. Já tivemos seis governos de centro, de esquerda e de direita desde o Plano Real—Eduardo Azeredo, Itamar Franco, Aécio Neves, Antônio Anastasia, Fernando Pimentel, e agora Romeu Zema—e a crise continua dramática. A crise está expressa no seguinte: duas moratórias da dívida (com Itamar Franco e, agora, com Romeu Zema); Minas perde receitas importantes (Lei Kandir e, agora, uma espécie de Lei Kandir 2, com o populismo fiscal de Bolsonaro com o ICMS dos Estados); a dívida de Minas, de R$ 159 bilhões (valor de dezembro de 2022), continua impagável; os servidores sofrem as consequências da crise, com arrocho salarial e atraso nos pagamentos; mais recentemente, o Estado não conseguiu sequer honrar os repasses constitucionais aos municípios; Minas, inacreditável, só tem recursos para investimentos graças ao acordo com a Vale referente aos crimes ambientais de Brumadinho de Mariana. É preciso aproveitar a presença de Lula na presidência da República e aprovar um “Plano de Resgaste” de nosso Estado, sem privatizações, sem congelamento dos servidores, sem destruição dos serviços públicos e com uma redução expressiva da dívida do Estado.
MINISTRO ALEXANDRE PADILHA, FALANDO EM NOME DO GOVERNO LULA, DEU A LINHA POLÍTICA: REGIME DE RECUPERAÇÃO FISCAL SIM, MAS SEM PRIVATIZAÇÕES, SEM DESTRUIÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS E,POR ISSO, A ASSEMBLEIA DE MINAS NÃO DEVE SE OMITIR: O ministro Alexandre Padilha, das Relações Institucionais, em um encontro com representantes da bancada de oposição mineira fez um importante depoimento sobre as diretrizes do governo Lula para a recuperação fiscal dos Estados. O depoimento foi gravado em vídeo, tendo o presidente do PT/MG na mesa, que levou um “pito” do ministro: “(A medida adotada) pelo Paulo Guedes não é o mesmo que o Haddad vai fazer. Porque as eleições deram a responsabilidade pro novo governo do presidente Lula e do novo ministro da Fazenda. Nós teremos o tratamento republicano e parceiro dos Estados e Municípios, vamos sempre apoiar e compreender o papel que a União pode ter para apoiar as dificuldades do Estado, mas não vamos usar os instrumentos que a União tem para estimular qualquer plano de privatização e qualquer plano privatista, que desmonte as políticas públicas em qualquer Estado. Então isso é uma diretriz muito clara”.(…) “Para nós é muito grave qualquer proposta como essa não ter sido debatida pela ALMG. O regime não é de um governo, ultrapassa governos. Então, se você não tem um órgão legislativo como órgão fiador do que pode ser a proposta, você está entregando na mão de um governo que é transitório. O que pode dar garantia que é um projeto que ultrapassa governos é exatamente o papel legislativo. Sempre foi assim, é uma instância fundamental que tem que ser respeitada”.(…) O vídeo teve ampla divulgação na imprensa mineira, O Tempo e Portal UAI, mas não teve a mesma repercussão na bancada de oposição de Minas que se reuniu em Brasília com o ministro, provavelmente porque Padilha sinalizou apoio ao Regime de Recuperação Fiscal. Concordamos com as diretrizes do ministro Alexandre Padilha sobre o Regime de Recuperação Fiscal – RRF sem privatizações e sem desmonte dos serviços públicos; somente discordamos de que a Assembleia de Minas já deveria ter aprovada o RRF há mais tempo. De outro lado, se tem razão os deputados e deputadas do PT e da oposição, que ajudaram impedir o avanço do RRF no passado; não tem porque se oporem agora a um RRF com os critérios apontados pelo ministro Alexandre Padilha.
MINAS TEM DÍVIDA SUPERIOR A DOS 22 ESTADOS MENOS ENDIVIDADOS; POR ISSO É QUE DIZEMOS QUE A DÍVIDA É IMPAGÁVEL. Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul estão “quebrados” há décadas. É preciso aproveitar uma oportunidade única neste momento e articular com o governo Lula um “plano de resgate” para Minas Gerais que interrompa, em definitivo, o “sangramento” de nosso Estado e recupere as finanças públicas estaduais, que é uma das bases para um projeto de desenvolvimento estadual. A esquerda não pode ser voluntarista na gestão do Estado; quando perde o controle da economia e das finanças públicas, como aconteceu no governo Fernando Pimentel, é fatal para a continuidade dos nossos projetos históricos.(…) A dívida de Minas Gerais junto à União é impagável: depois de 25 anos do acordo da dívida, a situação permanece sem solução. Nosso Estado tem 9% do PIB nacional, mas a dívida consolidada líquida, de R$ 143,439 bilhões, representa 18,80% da dívida corrente líquida, de R$ R$ 763,240 bilhões, dos 26 estados brasileiros. Juntos os quatro estados mais ricos do Brasil, com 56,3% de participação no PIB nacional, são os responsáveis por nada menos que 86,47% da dívida líquida dos estados. Veja a dívida de Minas Gerais: no montante de R$ 143,439 bilhões, ela é bem maior que a dívida líquida de 22 estados brasileiros, de R$ 103,230 bilhões. Impressionante, não é mesmo?
MINAS PRECISA DE UM “PLANO DE RESGATE”; ESQUERDA PRECISA LIDERAR ESTA PROPOSTA. O PT Minas, com razão, rejeitou nos últimos anos, o Regime de Recuperação Fiscal-RRF, devido às previsões de privatização das estatais mineiras e de um severo arrocho dos servidores públicos estaduais. Verdade que a negativa da Assembleia de Minas de aceitação do RRF impôs limites aos planos privatistas de Romeu Zema, mas, por outro lado, ajudou o governador com mais recursos para o caixa do Estado. Veja só: o RRF prevê a volta do pagamento da dívida (juros e amortizações) depois de 1 ano, na proporção de 11% ao ano; já a liminar do STF, que suspendeu a dívida de Minas Gerais, não previu a volta gradual do pagamento.(…) Mas veja: este Regime de Recuperação Fiscal do governo federal, é agora do governo Lula. Portanto, desde a posse de Lula, a esquerda já deveria ter mudado de posição, aceitando o debate da recuperação fiscal associada a mudanças a serem efetuadas pelo governo Lula. Como isso não se deu, foram os governadores de centro direita que acionaram o governo federal, ainda que as mudanças não sejam exatamente a que pretendiam, por exemplo, nenhum deles deve ter pedido a suspensão das privatizações.(…) A esquerda, em particular dos três estados mais endividados, não pode se omitir. Precisa formular propostas mais definitivas que resgate Minas Gerais (mais Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul) da falência; é preciso que o governo Lula mude já os termos do Regime de Recuperação Fiscal, acabando, por exemplo, com a exigência de privatização das estatais e de novas exigência em relação aos servidores para além da Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas isso não basta é preciso um plano de resgate do Estado muito mais ambicioso e urgente. Minha proposta: redução do limite de endividamento dos Estados de 200% da receita para 120%, percentual igual ao dos municípios, e “perdão” da parte da dívida acima deste novo percentual. Na minha análise, depois de 25 anos da federalização da dívida dos Estados, a situação de Minas precisa de uma solução mais definitiva, o perdão de parte da dívida. Mas não dá para reduzir o valor da dívida sem mexer no limite de endividamento, pois será um convite para a retomada do endividamento em patamares muito elevados. Daí porque proponho: redução do limite de endividamento de 200% da receita para 120% da receita, percentual igual ao dos municípios, o valor acima deste percentual deve ser “perdoado”. Isto não terá nenhuma consequência no endividamento de 23 estados, que já têm dívidas inferiores a 60% da receita.
STF IMPEDIU A EXECUÇÃO DE UMA DÍVIDA DE R$ 16,4 BILHÕES DE MINAS E EVITOU A FALÊNCIA DE NOSSO ESTADO. Para quem não sabe, Minas Gerais, porque não aderiu a tempo ao processo do Regime de Recuperação Fiscal – RRF, sofreu uma forte ameaça, recentemente, de falir com a tentativa de execução por parte do Ministério da Fazenda, de uma dívida de R$ 16,4 bilhões. Tenho uma posição contrária ao Regime de Recuperação Fiscal – RRF desejado por Romeu Zema, mas como a adesão não se verificou a tempo, coerentemente defendi que a dívida mineira não fosse executada. Não dá para ser contra o RRF de Romeu Zema e ao mesmo tempo aceitar as punições pelo seu não cumprimento. Sou oposição a Romeu Zema, mas não a Minas Gerais. A execução da dívida de Minas seria catastrófica para nosso Estado, com a paralisação da máquina pública, atraso do pagamento dos servidores e dos repasses constitucionais aos municípios.(…) Veja trechos da decisão do STF, que mostra as consequências dramáticas da execução: “Observo, de início, que o Executivo-requerente vem apresentando situação fiscal calamitosa”(…) “Feito o registro, apesar da condução política claudicante das finanças estaduais, o rompimento da avença de refinanciamento perante a União tem a potencialidade de causar severos prejuízos à continuidade da prestação dos serviços públicos, atingindo a população e os mais necessitados. Desta forma, identifico a urgência do provimento judicial ora requerido”.
MINAS, RIO DE JANEIRO E RIO GRANDE DO SUL SÃO FUNDAMENTAIS PARA UM PROJETO NACIONAL E PARA CONSOLIDAR UMA MAIORIA DE ESQUERDA NO BRASIL. Um projeto nacional, como defende Lula, não pode deixar para trás Minas, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. O ministro Fernando Haddad conhece muito bem o drama do endividamento de Estados e municípios. Ele, como prefeito, governou São Paulo, que era uma cidade falida e teve forte apoio do governo Dilma para sanear a capital paulista. Fernando Haddad assumiu a Prefeitura com dívida bruta de R$ 70,122 bilhões (218% da receita) e entregou com R$ 47,256 bilhões (110% da receita).(…) O governo Lula precisa olhar com mais atenção e carinho a situação dos três estados mais endividados porque representam parte expressiva da população e do PIB brasileiro, e a recuperação da finanças destes estados é fundamental para um projeto de desenvolvimento nacional. Além do mais são estados estratégicos para se consolidar uma maioria política e social da esquerda brasileira, como ficou claro em quase todas as eleições presidenciais.
José Prata de Araújo é economista.