FOCUS Brasil, 25/11/2022
O professor de economia política internacional da UFRJ prevê uma longa guerra cultural no continente, tendo em vista que a derrota da extrema-direita imposta por Lula, é apenas uma das muitas batalhas que teremos pela frente. “A América Latina é o único lugar do mundo onde o descontentamento e a fadiga social têm sido ainda capitalizadas eleitoralmente por forças políticas de esquerda, centro-esquerda e progressistas em geral”, lembra.
Luiz Inácio Lula da Silva vai assumir a Presidência da República em 1º de janeiro de 2023. O nível de cobrança por diferentes setores do mercado financeiro e os seus representantes na grande mídia é enorme. O desejo de pressionar o presidente eleito é tão grande que os editorialistas e muitos dos comentaristas e colunistas de economia ignoram a linha do tempo. Fazem questão de esquecer que houve um golpe de Estado no Brasil e que o teto de gastos é uma regra fiscal que não deu certo, algo já reconhecido por diferentes forças políticas e também pelas diferentes linhas de pensamento econômico.
A tentativa de pressionar Lula gerou reações críticas ao mercado, já que durante o governo Bolsonaro ela pouco ocorreu, mesmo com todo o desequilíbrio e desrespeito às instituições pelo governo que está chegando ao fim. É evidente que os setores que declaram apoio a Lula no segundo turno estão cobrando espaço já que ajudaram na vitória sobre Jair Bolsonaro. Lula teve 3 milhões de votos a mais que o presidente na segunda volta.
O debate entre desenvolvimentismo e equilíbrio fiscal é muito mais antigo do que a política brasileira, segundo José Luís Fiori, professor titular de economia política internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele afirma que a briga não terá fim e que qualquer decisão sobre o tema será fundamentalmente política e tomada pelo presidente eleito.
O professor diz que o debate está longe de ser o mais importante neste momento. “A volta de Lula é muito importante para a reorganização da América Latina, bem como da geopolítica global e, claro, para o desenvolvimento do Brasil que passará por um momento extremamente importante devido à reorganização da ordem mundial”.
Leia os principais trechos da entrevista:
Focus Brasil — Como você enxerga o papel do Brasil sob o novo governo Lula na geopolítica internacional?
José Luís Fiori — Existem dois consensos internacionais, neste momento. O primeiro é que o mundo está atravessando uma transição extremamente tensa e turbulenta, e que deverá durar pelo menos durante toda a primeira metade do século 21. É o fim da ordem internacional do pós-Guerra Fria, a ascensão da Ásia ao centro do tabuleiro econômico e geopolítico mundial, paralela ao declínio da hegemonia ética e cultural do mundo eurocêntrico, dentro do sistema internacional, e ao questionamento cada vez mais ostensivo do poder militar global dos “povos de língua inglesa”.
O segundo, é que o mundo ocidental carece neste momento de governantes com a liderança indispensável para atravessar esta zona de turbulência. Ainda é impossível prever se esta transição se dará através de uma reforma e negociação prolongada, ou se envolverá uma nova guerra hegemônica. Certamente serão tempos muito difíceis.
Neste contexto, o retorno de Lula ao governo e ao cenário internacional é um alento não apenas para a América Latina, mas para todo o mundo. Isso por sua experiencia acumulada, pelo seu carisma, e pela sua enorme visão e capacidade estratégica. Algo que fica muito em destaque depois dos quatro anos em que o Brasil foi alijado das grandes negociações internacionais, conduzido por um pobre coitado incapaz, mentalmente, de formular um pensamento completo ou mesmo frase com início, meio e fim, com sujeito, verbo e predicado, sem dizer palavrões, sem agredir alguém, ou sem extravasar seu escárnio permanente pela condição humana, e em particular pela condição sub-humana dos “condenados da terra”, do seu país e do mundo.
A presença de Lula dentro do sistema internacional vai muito além de tudo isto, mas não há dúvida que sua figura cresce frente ao mundo por haver conseguido derrotar uma coalisão de forças de extrema-direita, encastelada dentro do Estado e das Forças Armadas, e usando todos os instrumentos do poder e do dinheiro conseguidos com o controle do governo. Mas, além disso, a vitória de Lula culminou de certa forma um conjunto de vitórias das forças de progressistas e de esquerda nos principais países do continente, permitindo pensar na possibilidade da formação de um bloco regional de poder que ampliará em muito o volume da voz e da presença brasileira dentro do cenário internacional. A partir daí, o mais provável é que o Brasil, com o governo de Lula, possa retomar sua posição, mesmo entre as grandes potências do sistema, como uma nova grande potência pacificadora, sem nenhum passado bélico ou belicista.
Qual a contribuição para multipolaridade? Forçar a mão para ampliar o Conselho de Segurança das ONU?
O alinhamento natural do Brasil ao lado do bloco latino-americano, mas ao mesmo tempo dentro do BRICS, e junto à comunidade das nações africanas, aponta para o reforço da multipolaridade. Sem que seja necessário nenhum ataque direto aos Estados Unidos, como potência dominante dentro do hemisfério ocidental, e tendo grande afinidade com a maior parte dos países do G-7 e da União Europeia, o Brasil poderá ter um grande peso e dar uma contribuição decisiva para a definição e construção das normas e das instituições que deverão reger a nova ordem internacional que haverá de nascer dos conflitos que se multiplicam. O mundo vai se posicionando e sendo ordenado transitoriamente pelos conflitos centrais entre Estados Unidos e China, e entre a UE e a Rússia. Não é improvável que a evolução dos acontecimentos permita um consenso em torno da reformulação do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Mas com certeza isso não deve ser um ponto central da agenda externa do Brasil, porque neste momento as próprias Nações Unidas e todas as suas instâncias estão paralisadas e perderam capacidade decisória. Mais do que isto, perderam relevância e protagonismo eficaz neste momento de desconfiguração da geopolítica internacional.
A disputa entre China e EUA pode acabar se tornando uma oportunidade de desenvolvimento para o Brasil, uma vez que estadunidenses e europeus não querem mais depender totalmente da indústria chinesa?
Todas as grandes crises internacionais, envolvendo as grandes potências do sistema mundial, são oportunidades raras para os demais países com projetos nacionais e internacionais expansivos. Nestes momentos os países que alguns chamam de “semi-periféricos” logram abrir espaços e avançar seus projetos de mudança e escalada dentro das hierarquias mundiais de poder e riqueza. Mas também podem ser momento em que outros tantos países naufragam e retroagem inapelavelmente, perdendo o “bonde da história” e caindo em estados de letargia econômica e destruição social profundas e prolongadas. O que nós estamos vivendo neste momento é uma grande transformação mundial que tem muito a ver, mas que não se restringe à disputa e à competição entre os Estados Unidos e a China. A Guerra da Ucrânia é, em última instância, uma disputa pela hegemonia militar dentro da Europa, e já logrou acelerar o processo de desmonte da União Europeia tão bem costurado pelas forças conservadoras europeias depois do fim da Segunda Guerra Mundial.
São cada vez mais transparentes as disputas e conflitos entre Polônia e Alemanha, entre Itália e França, e para que dizer, entre a própria União Europeia e a Inglaterra. O declínio e a agressividade inglesa são cada vez maiores, e o projeto econômico da unificação está sendo minado pelas sanções econômicas americanas e europeias contra a Rússia. Esta será uma destruição profunda e prolongada e vai afetar todo o chamado mundo ocidental e, portanto, também ao Brasil.
Por outro lado, o mundo árabe, e todo o Oriente Médio estão se descolando do G7 e aproximando-se cada vez mais do sistema de alianças políticas e econômicas eurasianas. E é visível o avanço da extrema-direita dentro da Europa, na Hungria e Polônia, mas já agora também na Suécia, na Itália, e na própria França, no espaço aberto pelas antigas forças conservadoras e pela própria desidratação quase completa da socialdemocracia europeia. E por cima de tudo isto o que se assiste é a ascensão cada vez mais nítida da importância eurasiana e da liderança regional da China, que projeta seu poder econômico pelo mundo inteiro, já sendo a primeira e segunda maior parceira econômica de todos os países latino-americanos. Portanto, não há duvida que vivemos um momento de grande oportunidade para o Brasil, mas ao mesmo tempo deve-se ter presente que esta crise e transformação mundial deverá ter como consequência imediata uma desaceleração da economia mundial. Em 2023, a Europa deve entrar em recessão ou estagnar. E o mesmo deve ocorrer nos EUA e a própria China deve reduzir sua demanda global por matérias-primas. Portanto, não há milagres econômicos à vista, e a pressão distributiva deverá se intensificar em cima de orçamentos apertados e restringidos pelas baixas taxas de crescimento das próprias economias latinas.
A América Latina tem no momento muitos países que estão ou serão governados por grupos de esquerda, centro-esquerda e centro. Trata-se de uma oportunidade para o desenvolvimento da região e também para criar mecanismos mais fortes de cooperação?
Com certeza trata-se de uma oportunidade excepcional, mas não única. Sem que exista uma explicação convincente, a história da América Latina se caracteriza por grandes movimentos conjuntos e sincrônicos. Foi assim no século 19, e acentuou-se no século 20, depois das redemocratizações do pós-Segunda Guerra, e no momento das ditaduras militares dos anos 60 e 70. E o mesmo voltou a acontecer com as novas redemocratizações dos anos 80, com a onda neoliberal dos anos 90, com a “virada” à esquerda do início do século 21, à direita, na segunda década do século, e agora de novo à esquerda.
E, ao mesmo tempo, desde o fim da “era desenvolvimentista” o continente parece mover-se numa gangorra que ora aponta na direção neoliberal, ora na direção contrária, sem que seus principais governos consigam sustentar uma estratégia com sucesso e durante um período prolongado de tempo. Com a diferença que a estratégia econômica neoliberal vem se associando cada vez mais a um modelo “pinochetista” mesclado com forças políticas de extrema-direita e declaradamente fascistas ou nazistas. Por isso, mais do que nunca, urge que esta nova onda de governos progressistas logre definir e levar à frente uma estratégia bem sucedida de crescimento econômico.
Mas, sobretudo, mesmo sem um crescimento acelerado, que consiga implementar com sucesso uma estratégia de guerra econômica contra a desigualdade social, a indigência, a fome e a falta de moradia, saúde e educação que afetam até um terço da população latino-americana. Nesta nova tentativa, a esquerda e as forças progressistas em geral terão que conviver e enfrentar uma sociedade rachada de cima abaixo e extremamente polarizada em termos ideológicos, políticos e até mesmo religiosos. Com economias que se desindustrializaram quase todas regredindo para um padrão primário-exportador fortemente dependente das flutuações dos mercados internacionais, e com uma burguesia empresarial que expande seus lucros mesmo sem crescimento do PIB e que, por isso mesmo, é cada vez menos sensível a qualquer tipo de projeto nacional e popular de desenvolvimento.
Além disto, há que ter claro, que vivemos num momento em que as forças de esquerda apresentam-se extremamente divididas e com projetos político-econômicos muito diferentes entre si, e sem uma mesma bússola utópica comum, capaz de harmonizar as divergências imediatas em nome de um mesmo sonho de futuro.
É de se prever um retorno do projeto de integração latino-americana que foi sempre apoiado pelos progressistas e descartado pelos conservadores de direita e de extrema-direita. O Brasil deverá aumentar sua participação e liderar uma reativação dos vários fóruns regionais como Celac, Unasul e Mercosul.
Mas como já ficou comprovado no passado, até pela facilidade com que a direita os desativou, que estes fóruns são um instrumento importante de construção de consensos e de uma vontade coletiva comum. Mas eles padecem da falta de instrumentos eficazes para implementar politicas concretas, e inclusive para impedir a sua desmontagem nos momentos de mudança de governo. Haverá que repensar e redefinir o que realmente se pretende alcançar em cada um destes fóruns, fortalecendo um núcleo que assuma sua vanguarda e sua projeção internacional, onde deverão estar sem duvida alguma, Brasil, Argentina e México.
Qual é a opinião do senhor sobre a pressão que o mercado financeiro vem tentando fazer sobre o presidente eleito, antes mesmo do início do seu governo, utilizando-se dos economistas e dos seus argumentos para justificar a necessidade do equilibro fiscal? O senhor acha do recente debate entre estes e os desenvolvimentistas?
Esta é uma discussão muito antiga e recorrente. Eu quase diria que os argumentos esgrimidos são quase sempre os mesmos há muitos séculos sem que jamais se possa chegar a um acordo, uma vez que não se trata de um debate acadêmico ou teórico. Trata-se de uma decisão prática que deve ser tomada em função das condições conjunturais. As mesmas políticas econômicas podem ter resultados completamente diferentes, em distintos momentos históricos, e dependendo da posição hierárquica que seu país ocupe dentro do sistema de poder internacional.
E muitas vezes não há como conciliar, nem é possível montar um jogo de soma positiva, sendo necessário fazer escolhas onde haverá ganhadores e perdedores. No Brasil, este debate começou há muito tempo, já na segunda metade do século 19, com a discussão entre os “metalistas” e os “papelistas” e suas diferentes visões a respeito da “neutralidade da moeda”. Uma discussão que antecipa o debate brasileiro do século 20, entre monetaristas, liberais e ortodoxos, e desenvolvimentistas, protecionistas ou keynesianos, que começa logo depois da Segunda Guerra, entre Eugenio Gudin e Roberto Simonsen.
E a ladainha é quase exatamente a mesma, desde então, de um lado e do outro. Vargas, inclusive, inaugurou uma solução prática para estimular a convivência entre estes dois grupos que depois foi repetida por vários outros governos, colocando um monetarista ou fiscalista ortodoxo no Ministério da Fazenda, e um desenvolvimentista ou keynesiano na Presidência do Banco do Brasil e, depois, no Ministério de Planejamento.
Pode-se mesmo dizer que esta divergência é mais do que secular, é milenar. Mas, apesar disso, parece que ninguém consegue aprender que este não é um debate acadêmico e não existem verdades absolutas em matéria de política econômica, porque qualquer decisão que seja tomada envolverá sempre uma arbitragem que é fundamentalmente política, e que tem que ser feita pelos governos em função de seus objetivos estratégicos e em função dos interesses que se proponham a defender ou priorizar.
Para isso, existem as eleições, para fazer escolhas muitas vezes dolorosas e dramáticas. Basta dizer que o senhor Paulo Guedes “furou o tal do teto de gastos” — que é uma invenção absolutamente original e brasileira — em cerca de R$ 400 bilhões. E ninguém protestou. Nem na Faria Lima, nem entre os economistas de plantão defensores do “bom senso fiscal”. Agora, o simples anúncio de uma politica social aprovada pelo povo brasileiro já fez começar a gritaria dos “bons moços de Davos”. A respeito deste assunto sempre conto para meus alunos uma história muito antiga e paradigmática: a disputa política entre o Imperador chinês Yung-Lo, que reinou entre 1403 e 1424, e o seu ministro da fazenda, Hsia Yüan-Chi.
Yung-Lo foi um dos imperadores chineses com maior visão estratégica e expansionista de toda a história da China. Foi ele que concluiu as obras do Grande Canal comunicando o Mar da China e a antiga capital Nanquim, com a região mais pobre do norte do império, e foi ele que decidiu construir uma nova capital que veio a ser Pequim. Um gigantesco projeto desenvolvimentista que mobilizou e empregou durante muitos anos, milhares de trabalhadores, artesãos, soldados e arquitetos. Além disto, Yung-Lo se propôs estender a hegemonia chinesa — política, econômica e cultural — em todas as direções, e através das fronteiras territoriais da China, e também, na direção dos Mares do Sul, do Oceano Índico, do Golfo Pérsico e da Costa Africana. Foi durante o seu reinado que o Almirante Cheng Ho liderou seis grandes expedições navais que chegaram até a costa da África, no momento em que os portugueses estavam recém chegando a Ceuta. Durante todo seu reinado, as políticas desenvolvimentistas e expansionistas do Imperador Yung-Lo enfrentaram a oposição declarada de uma parte do mandarinato e das elites chinesas lideradas pelo seu próprio ministro da Fazenda, Hsia Yüan-Chi, um crítico ferrenho do excesso de gastos do império, e o defensor implacável do “equilíbrio fiscal”.
Por isto, o imperador Yung-Lo mandou prender seu ministro da Fazenda em 1421, mas pouco depois o imperador morreu, e o novo imperador, Chu Kao-Chih, recolocou no ministério das finanças o antigo ministro que interrompeu todas as obras e todas as expedições expansivas de Yung-Lo em nome do “corte de gastos” e da “responsabilidade fiscal”. E foi assim que o Império Ming perdeu seu fôlego expansivo e fechou-se sobre si mesmo, caindo no isolamento quase total, durante quase quatro séculos. Como disse um historiador inglês, “para levar à frente naquele momento a estratégia expansionista de Yung-Lo, teria sido necessária uma sucessão de líderes com a sua mesma visão vigorosa e estratégica, a visão de um construtor de impérios que não teve seguidores.” ( The Cambridge History of China, 1988, vol 7, pp:275). Mas não foi isto que aconteceu, e por isto não é inteiramente absurdo pensar que a China acabou atrasando em 500 anos o seu projeto atual de projeção da sua influência e do seu poder, graças à obsessão cega pelo “equilibro fiscal” do seu ministro da Fazenda, Hsia Yüan-Chi, um autêntico economista “ortodoxo” avant la lettre.
O mundo viu ascender um movimento de extrema-direita, que apela para questões imediatistas mas se utiliza de informações falsas ou distorcidas da realidade. Quais devem ser os passos a serem seguidos para esvaziá-lo?
Trata-se de um tsunami que vem crescendo há duas ou três décadas e agora está alcançando um nível de mobilização e agressividade sem precedentes. É um movimento que vem explodindo em vários lugares e países, de distintas maneiras, mas com um grande denominador comum, profundamente reacionário, contra todas as forças consideradas representantes do “sistema” ou do “status quo” nacional e internacional. Este impulso esteve presente nos EUA de Donald Trump, mas começou muito antes em Israel, passou pelo BREXIT, e está presente também na Rússia de Vladimir Putin, como na Polônia, Hungria, Suécia e Itália. Aqui, encontra-se mais uma razão da importância do que está passando na América Latina, o único lugar do mundo onde o descontentamento e a fadiga social têm sido ainda capitalizadas eleitoralmente por forças políticas de esquerda, centro-esquerda e progressistas em geral.
Talvez por isto mesmo, movimentos de extrema-direita do mundo todo tenham escolhido o México para realizar a sua mais recente assembleia, ainda em novembro. A Conferência Politica de Ação Conservadora acaba de reunir-se no México tutelados por Steve Bannon e reunindo lideres como José Kast, do Chile, Javier Milei, da Argentina, Santiago Abascal, da Espanha, Eduardo Bolsonaro, do Brasil, e Eduardo Verástegui, do próprio México. Eles estiveram com ativistas católicos, antiabortistas, anti-feministas, e contrários aos direitos da população LGBT, além anti-comunistas. Os principais oradores foram Steve Bannon e Lech Walesa. Isso permite avaliar a extensão desta onda que deverá ser enfrentada na América Latina. Deverá ser uma batalha longa e inusitada, porque a própria esquerda latino-americana nunca combateu um inimigo desta natureza. Uma batalha política e ideológica, uma guerra cultural entre a “modernidade iluminista”, ou alguns de seus herdeiros críticos, e esta “pós-modernidade medieval” obscurantista, religiosa, fanática e admiradora da violência.
Quase diria que a esquerda terá que reler e repensar a mensagem crítica de Paulo Freire para inventar novos caminhos de mobilização, educação e conscientização coletiva e mesmo massiva. Por antigo que possa parecer, uma espécie de reinvenção dos antigos centros de cultura, conscientização e mobilização popular dos anos 60, incluindo agora as redes de comunicação instantâneas postas à disposição da pedagogia da liberdade. Talvez não seja sem razão o ódio que têm de Paulo Freire, sem nunca tê-lo lido, figuras tão brutas, toscas e ignorantes, quase analfabetos como a família Bolsonaro, ou este General Heleno que esbraveja pelos cantos à espera do esquecimento.