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João Alves, katiane Gobbo e Lourenza Moraes: Entenda as mudanças no cálculo eleitoral após a decisão do STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) tomou uma decisão importante no dia 28 de fevereiro, ao derrubar por maioria a regra atual que define os critérios de distribuição das chamadas sobras eleitorais. Essa regra afeta a forma como as vagas de deputados e vereadores são preenchidas nas eleições. A Corte considerou inconstitucional a restrição que impedia alguns partidos de participarem da última fase da distribuição das sobras, permitindo agora que todas as siglas possam participar desse processo.

No entanto, o STF também decidiu, por maioria, que os efeitos dessa decisão se aplicam somente a eleições futuras e não devem afetar os mandatos atuais da Câmara dos Deputados. Isso significa que não haverá mudanças nos mandatos atuais em decorrência dessa decisão.

O presente texto tem como objetivo esclarecer o funcionamento da distribuição das vagas/cadeiras nas eleições proporcionais, especialmente nas eleições de 2024, através da explicação das três fases estabelecidas pelas regras vigentes até então. Além disso, será abordada a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que impacta diretamente esse processo eleitoral, analisando suas nuances e implicações no sistema político brasileiro. A compreensão desses aspectos é fundamental para uma visão ampla e esclarecedora do funcionamento do sistema eleitoral do país. Neste ano de 2024, em 06 de outubro, acontecem as Eleições Municipais em todo país, estarão em disputa os cargos de Prefeitos e Vereadores.

Foram propostas 03 Ações Diretas de Inconstitucionalidade – ADIs questionando os efeitos do §2º do artigo 109, inciso III, do código eleitoral, o qual define como critério de seleção das sobras das sobras. Estas ADIs foram julgadas em 28 de fevereiro deste ano, decidindo pela inconstitucionalidade do dispositivo.

Antes de aprofundar na decisão da Suprema Corte é necessário entender como se dá o quociente eleitoral (QE) e quociente partidário (QP), no sistema proporcional, que elege as câmaras legislativas.

O Quociente eleitoral – QE – não é um número fixo, visto que é o resultado da divisão do número de votos válidos (exclui-se os votos brancos e nulos) de determinada localidade da eleição pelo número de vagas a serem ocupadas.

Por exemplo, para as eleições de 2024, para a Câmara Municipal de Contagem estão disponíveis 25 cargos/cadeiras de vereadores, 04 cargos/cadeiras a mais em relação as eleições de 2020.

Assim, considerando a estimativa de 303 mil votos válidos em Contagem, o quociente eleitoral seria o resultado desses 303 mil votos divididos pelos 25 cargos disponíveis a vereadores. Nesta hipótese, o quociente eleitoral seria 12.120.

O Quociente partidário – QP – determina o número de cargos vagos que cada partido poderá ocupar. Também não é um número fixo. Para se obter o QP, divide o número de votos obtidos pelo partido (excluindo os brancos e nulos) pelo quociente eleitoral

Ressaltamos, que não há arredondamento para cima do valor do quociente eleitoral, de forma que as casas decimais serão desconsideradas.

No exemplo acima o quociente partidário é 3,3. Ou seja, o partido, do exemplo, terá a possibilidade de preencher até 03 cargos vagos.

As normativas das eleições trazem 03 balizas para preenchimento das vagas disponíveis no legislativo, a saber:

A PRIMEIRA FASE de distribuição das vagas implica em cumprir dois requisitos dispostos na lei que são: I) o partido precisa obter número de votos válidos igual ou superior ao quociente eleitoral, e II) cumprido o primeiro requisito, o candidato do partido precisa obter um desempenho individual igual ou superior a 10% ao quociente eleitoral.

Ou seja, usando o exemplo de Quociente Eleitoral da cidade de Contagem, de 12.120. O partido precisa ter pelos menos 12.120 votos, para obter 1 cadeira e, individualmente o candidato tem que chegar a um desempenho de 10% do QE – 1.212 votos.

Ocorre que após a Primeira Fase podem ficar cargos/cadeiras vagas, as sobras, assim temos a:

SEGUNDA FASE – conhecida como 80/20. Nesta fase, participa todos os partidos que cumpriram a primeira fase mais os partidos que alcançaram 80% do QE – 9.696 votos válidos, conforme o exemplo. Entretanto, o candidato nesta fase precisa ter um desempenho individual de 20% do quociente eleitoral – 2.424 votos.
Após a aplicação da primeira e segunda fase, se houver vagas/cadeiras para serem preenchidas – passa-se para a

TERCEIRA FASE – chamadas de sobras das sobras.

Nesta Terceira Fase que foi objeto de discussão sobre a inconstitucionalidade da norma que alterou a lei, ensejando as Ações Diretas de Inconstitucionalidade recentemente julgadas pelo Supremo Tribunal de Federal – STF.

A legislação discutida dispõe que para participar da terceira fase o partido deveria obter pelo menos 80% do valor do quociente eleitoral. Ou seja, apenas os partidos que passaram pela primeira e segunda fase poderiam participar da terceira fase.

Essa condição foi alegada nas ADIs como inconstitucional por afrontar os princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito, do pluralismo dos partidos políticos, isonomia, igualdade das chances, entre outros argumentos.

As ADIs foram ajuizadas no Supremo Tribunal Federal no ano de 2023, sob a relatoria do Ministro, hoje aposentado, Ricardo Lewandowski.

O Ministro Relator Lewandowski entendeu pela inconstitucionalidade do dispositivo, considerando que toda e qualquer norma que tenha por escopo restringir a pluralidade dos partidos políticos, limitando a eleição de seus representantes, notadamente no sistema proporcional, viola os fundamentos de nosso Estado Democrático de Direito.

De tal forma, após a decisão da Suprema Corte, a TERCEIRA FASE será por média. Após as duas primeiras fases, se ainda assim sobrarem vagas disponíveis, estas serão distribuídas aos partidos que tiverem a maior média calculada pelo número de votos válidos obtidos pelo partido dividido pelo número de cargos vagos definido pelo quociente partidário, somado ao número 1. Nesta fase, todos os partidos políticos poderão disputar a Terceira fase.

Seguindo os números dos exemplos acima, o quociente eleitoral é 12.120, o partido teve 40.000 votos, quociente partidário é 3,3 e o partido pode preencher 03 cargos vagos.

Percebe-se que o quociente eleitoral não entra no cálculo na TERCEIRA FASE.

Assim, na TERCEIRA FASE a distribuição das sobras das sobras será para os partidos que tiverem as maiores médias, até preencher as sobras todas.

Desta forma, mesmo um partido que obteve o quociente partidário igual a zero, e não teve direito a concorrer a nenhum cargo vago na primeira fase ou na segunda, tem a possibilidade de preencher um cargo vago (sobra da sobra) na TERCEIRA FASE.

Para o Ministro Lewandowski, é inaceitável que o STF chancele interpretação da norma que permita “tamanho desprezo ao voto“, em favor de candidato com baixíssima representatividade e, conforme os critérios empregados na segunda fase, pertence a partido já favorecido pela atual forma de cálculo:

“Por essas razões impõe-se que, após a aplicação da cláusula dupla de desempenho 80/20 na segunda fase do escrutínio eleitoral, as cadeiras que eventualmente sigam desocupadas sejam distribuídas entre todos os partidos que obtiveram votos no pleito, mediante uma interpretação conforme à Constituição do §2° do artigo 109 do CE e da regra de distribuição abrigada no inciso III do artigo 109 do CE (distribuição remanescente).”

Ainda, o Supremo Tribunal Federal julgou os efeitos dessa decisão no tempo considerando os princípios da anualidade e da modulação, sendo válido a aplicação do entendimento do Supremo já para as eleições de 2024.

Em resumo, após a decisão do STF considerando inconstitucional o disposto vigente, as eleições proporcionais para os cargos de escolha dos membros do legislativo, no caso, municipal já em 2024, podem acontecer em até TRÊS FASES, sendo:

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) não foi unânime e provocou interpretações diversas por parte dos partidos políticos em relação aos seus efeitos positivos e negativos. Algumas agremiações partidárias enxergaram a queda da regra 80/20 na terceira fase como uma vantagem para suas pretensões eleitorais. Por outro lado, outros partidos celebraram o fato de que a norma ainda privilegia aqueles com maior votação, legenda forte e candidatos com votação nominal alta.

Diante dessas perspectivas divergentes, fica evidente que a disputa eleitoral agora se dará em um contexto com regras definidas, o que certamente intensificará a movimentação na reta final da montagem das chapas proporcionais. O cenário político promete ser frenético, com os partidos buscando se posicionar estrategicamente dentro das novas diretrizes estabelecidas pela decisão do STF.

Lourenza Moraes é professora efetiva da rede municipal de Contagem há quase 12 anos e advogada especialista, atuante no Direito Eleitoral.

João Alves de Souza Junior é formado em Direito, Mestre e Doutorando pela PUC Minas, advogado eleitoral e professor universitário de cursos de graduação e pós-graduação.

Katiane Martins de Araújo Gobbo é formada em Direito, pós-graduada e advogada em Direito Eleitoral.

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