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Hamilton Reis: Reminiscências sobre a vida e a política em Contagem

A Câmara Municipal funcionava em prédio onde hoje está instalada a Regional Sede, em frente ao cine teatro. A construção se diferencia das demais por ter uma arquitetura moderna, em contraste com a vizinha, escola municipal Sabino Barroso, primeiro grupo escolar da cidade, inaugurado em 1914. Foi lá que fiz meu primeiro contato com o legislativo. Tudo começou quando a então vereadora Zulma Leal patrocinou com troféus a realização de um torneio esportivo na época em que cursava o ensino fundamental e editava um jornal escolar. Pedido feito por ofício e prontamente atendido por ela, então moradora do Eldorado.

Lembro que o lugar parecia um labirinto, que conduzia a uma sala maior, com carpete vermelho, onde ficava o plenário. Não imaginava que dali por diante a política faria parte da minha existência. Primeiro como cidadão, militante do movimento estudantil e depois como profissional atuando no movimento popular e sindical. Muitos anos depois, como assessor de comunicação de mandatos de vereadoras (Adélia Batista, Marília Campos e Maria Tereza Lara), deputadas estaduais (Marília Campos e Maria Tereza Lara) e do deputado federal Nilmário Miranda. E na sequência ocupando cargos na Prefeitura, nas gestões de Marília Campos, com quem trabalho há cerca de 23 anos, e na CeasaMinas, na presidência exercida pelo amigo Amarildo de Oliveira, advogado e empresário.

Nem em sonho poderia imaginar que iria conviver de perto com personagens que fizeram e são parte da história. Na primeira das dez eleições que disputou, Arnaldo de Oliveira, eleito em 1982, deu entrevista para o Boca Livre, jornal que ajudei na criar na Escola Estadual Helena Guerra. Recentemente, com a perda de um amigo em comum, ele relembrou aquele momento. Desde então, segue vereador, recordista de mandatos e se preparando para o próximo, superando Maria Lúcia Guedes, com quem tive a honra de trabalhar como colega de secretariado no segundo mandato da prefeita Marília Campos.

Em 1988, munido de entusiasmo juvenil, concorri a uma vaga na Câmara de Vereadores na chapa do PT. Tinha 21 anos de idade, e fiz uma campanha muito rudimentar e precária. Estava desempregado, e sem nenhuma estrutura, descobri como era dura a realidade do enfrentamento eleitoral. Gastei os sonhos que tinha acalentado naqueles verdes anos e guardei daquela experiência a gratidão pelos gloriosos 116 votos que tive e a certeza de que o meu lugar não deveria ser o da disputa. O que explica o gosto pelos bastidores, que me levou a atuar nas eleições seguintes como articulador e não mais como candidato. E em muitas delas, estive do lado vitorioso.

Naquele ano, o PT teve como candidato a prefeito Nilmário Miranda, que era deputado estadual e perdeu a disputa para o tucano Ademir Lucas. Mas o Partido elegeu uma das maiores bancadas da história do legislativo municipal. Foram escolhidos o professor e sindicalista Durval Ângelo de Andrade, os médicos Rubens Antônio de Campos e Eustáquio Roberto de Souza, a líder dos movimentos pela Moradia, Lúcia Helena Hilário e o metalúrgico e sindicalista Paulo Moura. Eram bons tempos aqueles, em que as reuniões partidárias eram feitas com o debate acalorado de ideias e projetos e nas quais as divergências eram ideológicas e embasadas pelo conhecimento teórico e/ou pelas práticas concretas.

As diversas correntes, como eram chamadas as atuais tendências, se organizavam e disputavam os seus espaços. Aqueles ricos embates internos, forjavam um Partido marcado por autenticidade e pelo desejo sincero de transformação social. Militantes que vinham da resistência armada à ditadura militar, dos movimentos social e sindical e das pastorais progressistas da igreja católica, transformavam plenárias em verdadeiras aulas de política e de vida. Tive o privilégio de conviver com pessoas ímpares em meus primeiros anos como filiado em Contagem e que permanecem na memória: Milton Freitas, Ignácio Hernandez, Tilden Santiago, Nilmário Miranda e muitos outros que fizeram parte da minha trajetória.

Um detalhe peculiar foi ter como concorrente meu pai, José dos Reis Vítor. Ele tinha sido candidato em 1982, convidado por Newton Cardoso, que foi eleito naquele ano novamente prefeito. Foi bem votado e terminou com terceiro suplente do PMDB. Na sua segunda tentativa saiu pelo PSB, que em 1988 teve como candidato a prefeito João Barbosa, numa linha auxiliar dos peemedebistas. Naquela época as urnas eram guardadas no poliesportivo do Riacho e os fiscais dormiam no local. No dia seguinte ao pleito, lembro que o encontrei conferindo as apurações e de seu comentário irônico, mediante o fraco desempenho daquela vez: “pelo jeito vamos ser eleitos presidente e vice-presidente da Câmara”. Meu pai sempre foi uma pessoa bem-humorada e identifico em mim a mesma característica, herança que ele me deixou.

Chegando aos 57 anos de idade, recordo com saudades dos caminhos percorridos e ao fazer essa reflexão sobre o que vivi, concluo que é chegada a hora de começar a contar histórias, para que elas fiquem registradas e possam ser conhecidas e reconhecidas por aqueles e aquelas com quem convivi. E, quem sabe, fiquem guardadas para a posteridade, pois como alguém já disse, a ambição de quem escreve é ser lembrado após a sua partida.

Hamilton Reis é jornalista e advogado.

 

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