A boa notícia é que agora o Ogro via televisão. Assistia preguiçoso Shrek na sessão da tarde e vibrava com seu personagem preferido, o burro, quando veio uma chamada em letras não tão garrafais quanto as das denúncias. O repórter dizia que o caso das larvas foi armação. Levou um susto. Teria sido descoberto o seu plano brilhante? Coçou a cabeça e o susto foi virando preocupação. O que fazer? Já sei, disse com seus botões o Ogro. Vou mentir de novo. E assim o fez.
Pego em contradição, o Ogro não se fez de rogado. Deu o grito. Vociferou. E citou um laudo, mesmo sabendo que eram três. Tentou ser esperto e na mentira se entregou de vez. Apontou o dedo para a polícia e sugeriu indícios de que o inquérito é imperfeito, sorrateiro, talvez. Insinuou o favorecimento da parte que se defendeu. Entregou que foi o primeiro a receber as supostas denúncias (olha aí a digital do Ogro, respeitável público) e que, sem nenhum interesse foi o defensor dos frascos e comprimidos da cliente indiciada. Não pelas plantadas larvas, mas por crimes outros: injúria racial misturada com desacato à guarda municipal.
A prefeita do Reino não tão distante também se manifestou. Com a certeza das provas na mão, ela não teve dúvida. Acusou diretamente a quem a ela é oposição. E rememorou a história toda, e disse que as larvas que apareceram na comida servida a crianças no Hospital Municipal, em setembro, foram colocadas nas marmitas de forma intencional. Deu na mídia a Polícia Civil afirmando que tudo não passou de fraude. De acordo com os laudos, os bichos encontrados nas marmitas não conseguiriam transpor o isopor que vedava a refeição servida. E nem conseguiriam se reproduzir na temperatura do alimento.
Foi golpe, artimanha, falcatrua, ardil, batota, burla, defraudação, dolo, embrulho, embuste, engano, farsa, galezia, intrujice, logro, ludíbrio, tapeação, trama, tramoia, trampolinice, trapaça, trapalhada, tratantada, definiu o dicionário, aberto no verbete campanha eleitoral antecipada.
Ah, mas o Ogro não se emenda. Também quer ter seu gado, como o mitômano que o inspira. Agora propaga, com ares de safada inocência, que deseja que tudo seja apurado de vez. Mesmo parecendo insensato, já que os dedos em riste para ele próprio estão apontados.
Saliva o Ogro. O Ogro saliva. Em sua calma premeditada, com seu trejeito de baixa credibilidade. Mas não se importa, tem patente de mentiroso, tem histórico na corporação, e advoga aos sete cantos, que também é cidadão. Não mesmo.
Pobre Ogro rico! Desesperado esperneia, olha a curva adiante e não sabe se terá gás. O despreparo atrapalha, a performance soa ridícula e não tem vídeo que dê jeito. O Ogro quando fala exagera no plural, se dá ao desfrute. Parece que é mágico na multiplicação. As larvas viram centenas, as denúncias milhares. E a cara de pau brilha na tela. É um mestre da empulhação. Seu olhar é de escárnio quando pinta o apocalipse e borda o caos, que existe apenas em sua fértil imaginação. Por isso, o Ogro nega os laudos. Se precisar, nega que negou.
Mas não se espere do Ogro coisa outra. O seu nível é baixo. Não entende a cidade, seus anseios e dificuldades. Nela não vive e sequer trabalha. Acha que o povo é só fantasia. Diz que mora no Reino não tão distante, mas todos sabem, atende em outro endereço. Sua cara de tacho só mantém por perto a necessária fachada para exercitar a sua demagogia.
Dizem que, se a maldade não der certo, e as investigações chegarem até ele, o Ogro já tem outro plano. Vai criar larvas. Virou especialista no assunto. E como bom negociante que é, mercador de ilusões, não vai deixar passar a oportunidade. Afinal, dizem a boca miúda que só tem uma coisa que o Ogro gosta mais do que política, bichos e gente: dinheiro. É bom então que a gente do Reino não tão distante fique atenta e não deixe prosperar por cá o Ogro de terras outras.
Hamilton Reis é jornalista e advogado.