“Até o início de abril, todo mundo vai mentir para todo mundo.” A frase é atribuída ao veterano vereador Gil Diniz, o Teteco, presidente local do MDB e líder do governo na Câmara Municipal. Ele a usa para se referir a movimentação de um seleto grupo, o de pré-candidatos e pré-candidatas, que precisam decidir a qual partido vão se filiar para disputar uma das 25 vagas que estarão em disputa nas eleições de 2024. O prazo é de seis meses antes das eleições.
Já o período entre 7 de março e 5 de abril, conhecido como janela partidária, é um consentimento à infidelidade para quem é detentor de mandato legislativo. Ele pode trocar a sigla pela qual foi eleito no pleito de 2020, sem ser punido por isso. Antes do prazo é possível, e acontece com frequência, uma relação consentida, mas desde que não seja oficial. É tolerada a convivência à semelhança daquela entre amantes, desde que mantidas as aparências.
A regra não se aplica aos cargos majoritários. Um prefeito, governador, presidente da República ou senador pode a qualquer momento trocar de partido. Infelizmente, alguns o fazem como se trocassem de roupa. O que em nada contribui para o fortalecimento do sistema de representação.
A data limite imposta pelo calendário do Tribunal Superior Eleitoral – TSE começa a definir como fica o cenário da disputa, cuja primeira etapa será decidida em 6 de outubro, ao final do primeiro turno, quando se conhece os escolhidos pelos eleitores para ocupar as 25 cadeiras legislativas a partir de 2025. Também é nesta data que será sabido se a escolha da prefeita Marília Campos à reeleição será sacramentada sem a necessidade de segundo turno. Como apontam as pesquisas até o momento.
Findo o prazo fatal de 6 de abril será possível, enfim, saber quem está onde. Explica-se. Hoje alguns conseguem a proeza de estarem em até quatro listas diferentes. Em muitos casos, a palavra dada tem pouca ou nenhuma importância. Não tem essa de fio de bigode. A coisa se resolve a peso de ouro mesmo. Com honrosas e raras exceções, de escolhas ideológicas, a maioria se movimenta pela lógica de um mercado no qual o que vale é o quem dá mais. Um jogo legitimado e regulado por quem comanda o balcão de negócios inflado por uma overdose de representações. Ao longo das últimas décadas saímos do bipartidarismo imposto pela ditadura militar via Arena e PMDB, para uma multiplicidade de legendas que beira a promiscuidade. São 29 aptas a disputa municipal, desde que tenham direção municipal eleita ou nomeada. Com os pedidos de registro em curso poderemos chegar a 47 Partidos registrados, pois tramitam no TSE 18 pedidos de partidos em formação.
Pelas regras atuais, cada Partido ou Federação poderá lançar chapa com até 26 nomes, dos quais 30% precisam resguardar a cota de gênero, masculino ou feminino. Ou seja, de 26 vagas, no mínimo 8 precisam ser de mulheres ou homens, em proporção inversa. Se cada Partido ou Federação lançar chapa completa teremos 442 candidatos e candidatas nas ruas em busca do voto. Em 2020, foram 699. Mais eleitores e eleitoras, menos candidatos e candidatas e quatro vagas a mais do que as 21 existentes nesta legislatura. O que pode reduzir o quociente eleitoral em relação a 2020, que foi de cerca de 14 mil. O quociente é calculado dividindo os votos válidos – excluem-se os brancos e nulos – pelo número de cadeiras em disputa.
A definição das chapas influencia também a disputa majoritária. Um dos efeitos das pesquisas de opinião pública é apontar quem é polo de poder. A candidatura apontada como mais forte sai na frente e atrai maior quantidade de aliados. A prefeita Marília Campos, que deve disputar a reeleição, tem uma base de sustentação que inclui 17 dos 21 parlamentares. Dos partidos representados na cidade, 17 declararam apoio ou a intenção de estarem juntos com ela. São eles: Federação PT, PCdoB, PV; PSB, MDB, União Brasil, PP, Republicanos, PSD, PDT, Federação PSDB; Cidadania, Podemos, PRTB, PMN, Federação Rede; PSOL. O outro lado, até aqui dividido, com pelo menos três pré-candidaturas a prefeito, é formado por PRD, PL, Novo, PSC e Avante. Lembrando que a oficialização das posições de cada Partido ou Federação acontece entre 20 de julho e 5 de agosto, quando é permitida a realização de convenções partidárias para deliberar sobre coligações e escolher candidatas e candidatos às prefeituras, bem como aos cargos de vereador. Definidas as candidaturas, as agremiações têm até 15 de agosto para registrar os nomes na Justiça Eleitoral. Já a propaganda eleitoral só pode ser feita a partir de 16 de agosto de 2024.
Até as convenções é possível que ocorram mudanças. A oposição pode se juntar caso a polarização se coloque como inevitável, e as eleições caminhem para serem decididas em turno único. A estratégia de pulverização dos votos, lançando diversas candidaturas, parece ser menos provável. Não há indícios de que teremos de novo 15 pretendentes ao Palácio do Registro, como em 2020.
Se a prefeita mantiver a sua liderança consolidada, a escolha de alguns será poupar energia e dinheiro para disputar a sucessão de Marília, em 2028, caso ela vença e assuma um quarto mandato.
A possibilidade de vitória no primeiro turno estimula ainda mais o debate sobre quem será o vice de Marília. O cargo é cobiçado e a lista de pretendentes é grande. Além disso, terá função estratégica. Se a prefeita for reeleita seu nome continuará fortalecido para 2026. Se dependesse de parte significativa de seu eleitorado, ela seria candidata a governadora ou senadora. Se dependesse de alguns pretendentes ao governo de Minas, a petista seria a vice perfeita. Em um ou outro caso, ela teria que renunciar ao mandato e o vice, ou a vice-prefeita, assumiria por dois anos.
Se o cenário for pelo cumprimento dos quatro anos, a vice ou o vice passa a ser visto como forte candidato à sucessão, pois a lei impede que Marília tenha um terceiro mandato consecutivo. Por isso, desta vez a escolha ganha novos ingredientes e o suspense deve ser mantido até próximo do prazo final do registro da chapa, o que dá margem a especulações variadas.
Mas isso não é algo que ocupa Marília Campos, porque é uma escolha a ser feita na hora certa. Para ela o foco é a gestão. A entrega de obras, o aprimoramento da prestação de serviços, o cumprimento de metas, o bom funcionamento da máquina pública. O desafio da prefeita é seguir fazendo um governo de excelência e manter em alta uma aprovação recorde de cerca de 80%.
Portanto, o ano promete emoções e os prazos estão apenas começando. Longe do cidadão e cidadã, mais preocupado com as contas do mês e com a sobrevivência, os bastidores da política fervilham. O que me lembra a frase do general alemão Otto von Bismarck que teria dito que “quanto menos as pessoas souberem como se fazem as salsichas e as leis, melhor dormirão à noite”. Por minha conta e risco acrescento à lista que também devem saber o menos possível sobre como são feitas as chapas proporcionais.
Hamilton Reis é jornalista e advogado.