Nos idos dos tempos de infância, na tenra idade, a bicicleta, simbolizava, em grande medida, o rompimento do cordão umbilical, a nossa autonomia, um laço que unia o destino, o nosso fio de esperança.
Desde as pedaladas iniciais- sobre as rodinhas empenadas, manuseando um guidão torto, nos conduzindo por caminhos sinuosos, ilusionados pela dimensão e liberdade da rua, em quedas, pedagógicas e inevitáveis, amenizadas por mertiolate e gessos- moldávamos nosso repertório e resiliência pueris.
Da rebeldia revolucionária infantil, ingressávamos nas primeiras regras da vida, pelos circuitos da “Transitolândia”, onde seguíamos as normas de trânsito, com as nossas bikes, através do percurso simulando uma via de “gente grande”. A cada vermelho e verde, do semáforo, uma sensação única de invencibilidade e controle, como se já estivéssemos avançando para uma nova fase e preparados para encarar os espectros de nossa existência.
As ditas magrelas sempre tiveram um importante e fundamental papel de autonomia e mobilidade na vida de grande parte da sociedade. Incluindo todos os nichos sociais. Uma atividade, definitivamente, democrática. Do menino da periferia aos grupos de bicicleta tão em voga nos últimos tempos. Uma força motriz que propulsiona o convívio social, a urbanidade, e o recrudescimento de coletividade.
Por falar em coletividade, as políticas públicas em torno das bicicletas e ciclovias estão presentes em todos os rincões do mundo, promovendo, incansavelmente, o ciclismo como um instrumento de locomoção urbana.
A Organização das Nações Unidas- ONU elegeu a bicicleta como o transporte ecologicamente mais sustentável do planeta. E, ainda, por meio, de sua Assembleia Geral, criou o Dia Mundial da Bicicleta, promovendo e estimulando, assim, os governantes a adotarem práticas progressistas, ambientais e sustentáveis, auxiliando tanto no aprimoramento nas maneiras de locomoção nas urbanizações, quanto nas repercussões climáticas que a cada vez mais se fazem sintomáticas.
Dentre algumas cidades universais que promovem um intenso incentivo às ciclofaixas podemos citar: Bogotá, Medellín, Portland, Amsterdã, Barcelona, Copenhague, Paris. Destas, notadamente, Bogotá, com seu programa, “Ciclovía”, e, Paris, com o “Vélib”.
No Brasil, o Município de São Paulo, entre os anos 2013 e 2016, no governo do então prefeito Fernando Haddad, implementou 400km de vias de ciclovias e ciclofaixas, tornando-se um grande exemplo do país em políticas públicas do metiê ciclístico. O jornal estadunidense “The New York Times” sentenciou, à época, que o atual Ministro da Fazenda realizou um “tratamento de choque urbano”, e, que, em décadas, desafiou a “supremacia do automóvel”. Como se não bastasse, outro periódico com sede na Big Apple, “The Wall Street Journal”, atestou que se acaso o professor universitário comandasse cidades como, San Francisco, ou, Berlim, seria alçado como “visionário”, em uma nítida crítica ao setor conservador paulistano. Não podemos deixar de mencionar a urbe de Fortaleza; talvez a capital do país que mais tenha estrutura e projetos cicloviários consistentes.
Falando sobre nosso quintal e grama verde, a cidade de Contagem, dentre políticas públicas, das mais variadas, também, aderiu às ciclovias e ciclofaixas; o Governo Marília segue seu caminho sob o baluarte dos princípios modernos e políticas universais, projetando, assim, permanentemente, características das relatadas “Cidades do Futuro”.
Em 2021, o governo inaugurou a primeira ciclofaixa da cidade, localizada à avenida Severino Ballesteros. A ciclofaixa do Parque Sarandi tem uma extensão de mais de 4km, percorrendo um trajeto intermunicipal, conectando-se à Região da Pampulha. Na oportunidade, fonte retirada do acervo jornalístico da municipalidade, a Prefeita Marília Campos revelou: “É apenas o início. Nós temos um plano de ciclovias e ciclofaixas para apresentar para a cidade”.
Não deu outra. Há poucos dias foi divulgado nas redes o início de obras de ciclovia, na avenida Firmo de Matos; sendo prevista a cobertura de uma extensão de 7km- a maior ciclovia já projetada na cidade. Os estudos estão sendo realizados por uma equipe multidisciplinar para avaliação dos impactos, em observância à Lei Complementar n. 295/2020, que dispõe sobre o parcelamento, a ocupação e o uso do solo.
A informação é de que transpassará diversos pontos estratégicos das regionais Riacho e Eldorado; ademais, notícias de que será implantado o sistema de bicicletas compartilhadas, algo já utilizado em várias cidades ao redor do mundo, o que viabilizaria e estimularia a locomoção e o fomento da mobilidade urbana impulsionando a convivência e integração da comunidade.
É de fundamental importância esse viés de políticas públicas que criam ciclovias seguras e acessíveis, entrelaçando bairros e afetos, fomentando, decisivamente, a mobilidade sustentável. Quanto mais projeções e estímulos de governantes comprometidos com essa visão de futuro, mais a sociedade acolherá e experimentará o deleite de se moverem de maneira eficiente e ecológica.
Por todas as razões expostas, Contagem pedala na direção de sendas virtuosas. Em caminhos tais quais como a icônica cena de bicicleta da película “Butch Cassidy and the Sundance Kid”, sob a catártica canção “Raindrops Keep Fallin’ On My Head” de B.J. Thomas. Ou, quem sabe, pelas trilhas da essência indelével de Cyril, personagem do filme, “O Garoto da Bicicleta”, dos irmãos belgas, Jean-Pierre e Luc Dardenne, que, embora as crueldades da vida tenham-no enrijecido, compensa as suas dilacerações, projetando em sua bicicleta, toda a liberdade, independência, mobilidade e ternura.
Lucas Corrêa Fidelis é advogado e servidor público.