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Hamilton Reis: Casca de bala, Marília e Lula fazem história em Contagem

Da janela de casa ainda dava para ouvir os últimos sons vindos do local do evento. A noite de 27 de junho de 2024, que chegou trazendo com ela o frio gostoso do inverno tingia o céu de uma tonalidade bonita, mistura de cores. O viaduto, logo ali, ao alcance dos olhos, registrava trânsito intenso, lentamente se espalhando pela via em dois sentidos opostos. As pessoas voltavam para casa depois de uma tarde diferente. A longa espera pela chegada do presidente da República tinha sido recompensada pela presença ímpar de Lula. Sua voz, seu carisma, sua força, ainda ecoavam pelos ares. Uma energia boa caiu sobre a cidade. Contagem viveu um dia importante, foi o centro das atenções.

No palco, uma constelação de autoridades se fez presente. Ministros, parlamentares, convidados. E dentre eles, uma estrela que brilhou intensamente: Marília Campos. Anfitriã do grande encontro entre Lula e o povo, a prefeita conduziu o ato. Foi a dona da festa. Fez um discurso à altura de sua trajetória e do momento que vive, de reconhecimento e aclamação. Não apenas por parte de seus pares, mas, sobretudo, pela aprovação do povo, que tem com ela uma rara relação de amor e respeito, que perpassa classes sociais, escolaridade, religião, renda e as demais segmentações apontadas nas diversas pesquisas de opinião pública. As quais lidera com folga, distinção e mérito.
Marília agradeceu os recursos federais destinados à cidade. E aproveitou para pedir mais investimentos. Cobrou atenção ao transporte sobre trilhos, como forma de melhorar a mobilidade urbana. E, como estadista que é, pediu atenção especial do presidente para a renegociação da dívida do Estado com a União. Não como candidata a governadora, como querem cada vez mais pessoas, mas como cidadã que pensa em tempos melhores para Minas Gerais.

Marília vive hoje o auge de sua maturidade. Traz com ela a experiência de uma vida colocada a serviço de causas nobres. Foi vereadora, deputada e pela terceira vez governa Contagem. É a primeira e única mulher a exercer o cargo e a primeira a ser reeleita. Também é a que mais anos está à frente da administração, outra de suas marcas históricas como governante.

Nas palavras de Lula, ela é “uma daquelas pessoas que, se não tivesse nascido, teria que nascer. Uma figura com um grau de fraternidade extraordinário e um companheirismo imbatível”. Fazer viadutos e pontes, qualquer um pode fazer, mas cuidar das pessoas mais humildes e necessitadas, só se faz com emoção, com o coração, como Marília faz. E essas são virtudes importantes para quem cuida do povo, expressou o presidente.

Pouco antes, ele tinha testemunhado a alegria de Marília ao receber o anúncio de investimentos por parte do governo federal, de cerca de 112 milhões para conclusão das obras de mobilidade e drenagem do complexo da avenida Maracanã e para a construção de três estações do Sistema Integrado de Transporte – SIM. Ao ouvir a novidade proferida pelo ministro das Cidades, Jader Filho, a prefeita quebrou o protocolo, se levantou e exultante foi até Lula para abraçá-lo e agradecer. Uma manifestação de pura vibração e felicidade. Marília sendo Marília.

Lula e Marília têm muito em comum. Ambos foram sindicalistas. Ele metalúrgico, ela bancária. Sempre foram petistas. Fundadores do Partido dos Trabalhadores e da Central Única dos Trabalhadores. Ela deputada estadual eleita para três mandatos, ele deputado federal constituinte em 1988. Os dois exercendo com gosto mandatos executivos pela terceira vez. E não é segredo que preferem comandar ao invés de legislar.

Lula relembrou as campanhas que fez em Contagem e as vezes em que esteve nas portas de fábricas. Mencionou a marcante greve dos metalúrgicos em 1968, primeira a desafiar a ditadura militar e que se tornou referência para a classe trabalhadora brasileira. Marília deu a ele cópia de uma foto que registrou quando dois juntos caminhavam pela avenida João César de Oliveira, na campanha de 1996, em sua primeira disputa pela prefeita, quando chegou em terceiro lugar. Eu era uma menina, e Lula bem mais novo, registrou.

Era o início de uma caminhada que a levou quatro anos depois à Câmara de Vereadores, seis anos após à Assembleia Legislativa e oito anos posteriores à Prefeitura pela primeira vez. Já Lula chegaria ao Palácio do Planalto em 2002, em uma vitória bela, emocionante, épica. Fizeram gestões de excelência e foram reconduzidos. Anos depois, em 2018, Lula foi injustamente condenado e preso. Amargou 580 dias de cárcere, antes das sentenças serem anuladas por fraudes no processo. Eleito em 2022, voltou nos braços do povo para dirigir o país. Dois anos antes, Marília tinha conquistado seu terceiro mandato para conduzir o executivo municipal.

Com tantas similaridades entre Lula e Marília, causou estranheza o comportamento da oposição local. Faixas apócrifas espalhadas na madrugada do dia da visita presidencial usavam o nome da prefeita para agradecer a vinda do presidente. Não fosse pelo anonimato criminoso de quem as fez, caso a ser tratado na esfera policial, cumpririam um papel importante, registrando a importância do evento. Mas se o objetivo era indicar a ligação entre os dois, o esforço soa inócuo, desnecessário. Lula e Marília são “casca de bala”. Todo mundo já sabe disso.

Como também é sabido que “toda a unanimidade é burra”, frase imortalizada por Nelson Rodrigues. Marília tem seus desafetos. Uma dúzia deles inclusive estava reunida ao lado do prédio da Regional Sede. O barulho da patética manifestação não ecoou em lugar nenhum. As imagens de Marília e Lula utilizadas no local serviram mais como afirmação do incômodo que causa o fato de serem bem avaliados e bem quistos pela maioria dos contagenses.

Se a tentativa foi de nacionalizar o debate, como querem os possíveis adversários no pleito que se avizinha, o tiro saiu pela culatra. Marília e Lula falaram do presente e do futuro. Do que interessa de fato para a vida das pessoas: investimentos para mobilidade, educação, asfalto novo, medicamentos e mais médicos nas unidades de saúde. É isso e muito mais o que o povo quer e precisa. Segregar, propagar discursos de ódio e apostar nas desavenças é algo que precisa ser superado. A esperança vai vencer o medo, porque o que faz a vida valer a pena é cada um fazer a sua parte para que o mundo seja um lugar melhor para se viver, amar, trabalhar e ser feliz.

Hamilton Reis é jornalista e advogado.

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