O PT, do nosso presidente Lula, e o PL, de Jair Bolsonaro, tem um discurso padrão para todos os ambientes, seja no Brasil, nos Estados, nos municípios. Os pré-candidatos dos dois partidos, já bem próximo das eleições municipais, só tratam das questões nacionais. Tudo indica que PT e PL vão tentar transportar para os municípios a lógica da política nacional, a “nacionalização” das eleições municipais. Mas as eleições municipais, como foram no passado, e como as pesquisas atuais indicam, são as menos nacionalizadas das eleições, são decididas pelas questões mais concretas de cada município, pelas questões mais paroquiais, até mesmo em capitais e grandes cidades.
POR QUE AS ELEIÇÕES MUNICIPAIS FAVORECEM OS PARTIDOS DO CENTRÃO. Em países, com poucos partidos, são eles que hegemonizam a eleição no plano nacional até o local; nestes casos existe uma grande verticalização da política já que os partidos mais representativos são os mesmos em todas as eleições nas três esferas de governo. No Brasil é diferente. Nas eleições municipais, PT e PL serão bem votados, mas os partidos de centro, que tiveram pequeno protagonismo na eleição presidencial – PSD, PP, União Brasil, MDB, PSDB -, são os que tem, disparado, o maior número de prefeitos. Nas eleições de 2020, estes cinco partidos elegeram 3.166 prefeitos, 57% de todos os prefeitos dos 5.570 municípios brasileiros.(…) Matéria do site do Senado avaliou assim as eleições municipais de 2020: “MDB, PSD, PP e DEM, legendas consideradas fiéis da balança no Congresso Nacional, vão governar cerca de 43% da população brasileira. Esses quatro partidos conquistaram 13 das 25 capitais brasileiras em disputa (Macapá, capital do Amapá, teve seu pleito adiado para dezembro devido ao apagão que atingiu o estado, e Brasília não realiza eleições municipais, embora o Distrito Federal seja governado pelo MDB). Além disso, conquistaram 43 dos 96 maiores municípios brasileiros (capitais e cidades com mais de 200 mil eleitores) e 2.591 do total de 5.570 cidades do país. Se somadas as populações das cidades onde MDB, PSD, PP e DEM venceram as eleições, chega-se a 90,2 milhões de pessoas cujo dia a dia será administrado por prefeitos desses partidos. O contingente é próximo à metade do total de brasileiros, segundo a consolidação mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além desse grupo, o PSDB fecha a lista dos 5 partidos que chefiarão mais prefeituras a partir de 2020, e aproveitou o segundo turno para melhorar o seu retrato nas urnas. A sigla foi a que mais perdeu prefeitos e vereadores em números absolutos, mas manteve o comando da maior cidade do país, São Paulo (SP), e levou 18 dos 96 maiores municípios. Ao todo, o PSDB governará a maior fatia do país para um partido só: 34 milhões de pessoas, ou 16% da população nacional. Mais de um terço desse total está apenas na capital paulista”.(…) O site do Senado registra o enfraquecimento dos partidos de esquerda: “O resultado do segundo turno também confirmou a redução do espaço dos partidos tradicionais de esquerda. PDT, PSB, PT e PCdoB perderam prefeituras em relação a 2016 e governarão, juntos, 27 milhões de habitantes, ou menos de 13% da população total. O grupo venceu em apenas 12 das 96 maiores cidades. Apenas quatro capitais serão chefiadas por essas legendas, todas no Nordeste: Recife (PE) e Maceió (AL) com o PSB, Fortaleza (CE) e Aracaju (SE) com o PDT. É a primeira vez desde a redemocratização do país que o PT não elege nenhum prefeito de capital”.(…) Os cinco maiores partidos de centro foram os que mais cresceram, agora em 2023, com as mudanças de partidos. Passaram de 3.166 prefeitos, na eleição de 2020, para 3.427 (62% do total) agora no final de 2023. Veja o número de prefeitos dos cinco principais partidos de centro: PSD lidera com 968 prefeitos, basicamente com a filiação em massa de prefeitos tucanos de São Paulo, MDB vem em seguida com 838, seguidos do PP com 712, União Brasil com 564 e PSDB com 345. PT e PL, os principais protagonistas no plano federal, tem respectivamente 227 (4,1% do total) e 371 prefeitos (6,6% do total). (…) De outro lado, cinco partidos de centro (MDB, PP, PSD, PSDB e DEM (União Brasil) elegeram 28.000 vereadores, o que representa 48% dos 58.208 vereadores de todo o Brasil.
TODAS AS PESQUISAS DIVULGADAS ATÉ AGORA MOSTRAM QUE O QUE VAI POLARIZAR AS ELEIÇÕES MUNICIPAIS SERÃO AS QUESTÕES CONCRETAS DE CADA MUNICÍPIO. Quem tem feito mais pesquisas das eleições municipais até agora é o Instituto Paraná Pesquisas, que, muito criticado, acabou sendo o que acertou os resultados das eleições presidenciais. Pois bem, no início deste ano de 2024 este Instituto divulgou uma pesquisa específica sobre o “Impacto de apoios a um candidato a Prefeito”. De forma resumida os resultados foram os seguintes: a) Lula: o apoio do presidente “aumenta” em 31,6% a vontade de votar em um candidato a prefeito(a) e os que responderam “não altera”, “diminui” e “não sabe / não respondeu” somaram 68,4%; b) Bolsonaro: o apoio do ex-presidente pesa para 29,2% dos eleitores e os demais 70,8% responderam: “não altera”, “diminui” e “Não sabe / não respondeu”.(…) Numa recente pesquisa do Paraná Pesquisas para a Prefeitura de São Paulo até mesmo na capital paulista as questões específicas da cidade é que decidirão a eleição. Perguntados “como se dará a preferência para a escolha de um prefeito de São Paulo”, os eleitores responderam: 46,7% pelo projeto de governo que representa; 22,0% por nada disso, vai resolver em quem irá votar apenas na semana da eleição; 16,5% pelo apoio do presidente Lula; 12,4% pelo apoio do ex-presidente Bolsonaro; e 2,3% não sabe / não respondeu. Na mais recente pesquisa do Paraná Pesquisas, com o crescimento da temática municipal e melhoria da avaliação do prefeito Ricardo Nunes, ele ultrapassou pela primeira vez Guilherme Boulos no primeiro e no segundo turnos. (…) E veja só: mesmo nos municípios que PT e PL tiverem candidatos não está garantida a polarização porque um partido pode ser competitivo e o outro não e a polarização será com outro partido de centro direita que tiver uma candidatura competitiva.(…) Na minha análise o governo Lula e o próprio presidente não terão condições de nacionalizar as eleições. Lula dificilmente terá condições, ele próprio, de se engajar numa polarização das eleições municipais, sobretudo no primeiro turno, porque isso destruiria a governabilidade no plano federal; de outro lado o PL, de Jair Bolsonaro, terá dificuldades de nacionalizar as eleições, uma espécie de terceiro turno, porque o governo Lula está dando certo.(…) Não temos na história recente da democracia brasileira, uma eleição municipal amplamente nacionalizada. Veja a eleição de 2020, no auge na polarização em nosso País. PT e PL, Lula e Bolsonaro, travaram um combate intenso, o PT lançou um grande número de candidatos; e nas capitais nem PT nem PL elegeram um único prefeito; os partidos de centro ganharam quase tudo.
PARTIDOS DE CENTRO VÃO “JOGAR PARADOS” PORQUE SERÃO A ALTERNATIVA, NO PRIMEIRO OU NO SEGUNDO TURNOS, DE UM DOS PARTIDOS POLARIZADOS: PT E PL. São vários os fatores que favorecem os partidos de centro nas eleições municipais: a) os prefeitos estão, na média do Brasil, com alta aprovação popular: pesquisa CNT/MDA, de janeiro de 2024, feita de forma genérica para todas as cidades, mostra que os prefeitos e prefeitas tem, em geral, uma boa avaliação: 45,6% para bom e ótimo; 26,9% afirma ser regular; 23,8% para ruim e péssimo; e 3,7% não sabe / não respondeu; dados do IPEC também confirmam a boa avaliação dos prefeitos; b) a eleição deverá ser marcada pelo “sentimento de continuidade”, o que favorece muito os partidos do Centrão, que tem muitos prefeitos; c) o articulista Alon Feuerwerker, com base em dados deste tipo afirma que “a avaliação dos governadores e prefeitos parece menos contaminada pela polarização”; d) a política municipal é menos polarizada que a nacional porque os partidos que polarizam – PT e PL – tem pouca força nos municípios e são eleições mais pragmáticas, onde o que pesa decisivamente são as questões concretas de cada cidade. (…) E se não bastasse todas estes diferenciais, os partidos de centro, por incrível que pareça, se beneficiarão da polarização em duas situações: sempre que um dos partidos polarizados – PT e PL – não tiverem candidaturas competitivas no primeiro turno, eles escolherão candidatos dos partidos de centro para apoiarem, como o PT e o PL tem indicado, por exemplo, em inúmeros locais; no segundo turno sempre que a disputa se der entre um candidato de centro e de um partido polarizado, o outro partido polarizado que não foi ao segundo turno muito provavelmente vai apoiar o candidato do partido de centro. Impressionante!
MARIA CRISTINA FERNANDES: O QUE É DRAMÁTICO É A FRAGILIDADE DA ESQUERDA NOS MUNICÍPIOS. Em um importante artigo, a colunista Maria Cristina Fernandes apontou o monumental desafio da esquerda: “O que dá a esta eleição de 2024 mais dramaticidade não é apenas a chance de sobrevivência do bolsonarismo, mas o grau de fragilidade, nos municípios, dos partidos da centro-esquerda ante um crescimento contínuo dos partidos de direita. A composição do Congresso evidencia que Lula já foi eleito na contramão dessa tendência. Agora parece determinado a fazer convergir as curvas de sua fatia no eleitorado nacional e aquelas das bases municipais dos partidos de centro-esquerda. Enfrenta um Himalaia de obstáculos. Da desatenção às bases locais da política, como a disputa pelos conselhos tutelares revelou, ao impacto das emendas parlamentares sobre a política municipal. Dados do Portal da Transparência mostram que os picos de execução das emendas parlamentares aconteceram em 2016 e 2020, anos das duas últimas eleições municipais. O viés de direita não apenas domina o Congresso como também a execução das emendas parlamentares. Inclusive neste governo. Ao longo do primeiro ano do governo Lula, segundo o Portal da Transparência, entre as seis legendas que mais executaram emendas parlamentares, cinco são de centro ou de direita (PL, PSD, MDB, União e PP). São partidos para os quais o lançamento de candidaturas presidenciais se tornou acessório. Preferem se concentrar nas disputas proporcionais porque é do Congresso que emana o poder que detêm sobre verbas eleitorais e partidárias e sobre as emendas parlamentares. A sexta legenda é o PT, que abocanhou 17% das emendas e ficou em terceiro lugar em execução orçamentária no clube dos seis maiores partidos do Congresso. O apelo de Lula por uma eleição polarizada enfrenta uma dificuldade adicional que é seu isolamento no bloco dos grandes partidos. Os demais partidos de esquerda (Psol, Rede, PCdoB, PV, PSB, PDT), ao contrário do que aconteceu com as novas siglas surgidas nos últimos anos por fusão ou geração espontânea (PSD, Republicanos, União, PP), não ganharam musculatura no Congresso e, em consequência, nem nas prefeituras – ou em decorrência delas. Sem bancadas para disputar fatias mais representativas dos fundos eleitoral e partidário e emendas parlamentares, os partidos de esquerda se enredam num círculo vicioso que os condena ao nanismo. (…) O PT nunca teve, nas eleições proporcionais e nas disputas majoritárias locais, a proporção de votos que obteve ao longo cie sua história para a Presidência da República, mas a desproporção nunca foi tão grande quanto hoje. Em nenhum quesito o partido é mais franzino do que na política municipal. É o 11- em número de prefeitos, tendo sido superado pelo PSB e pelo PDT nas duas últimas eleições municipais e até mesmo por um partido que caminha para a inanição, como o PSDB”. (Valor Econômico, 01/03/2024). (…) José Dirceu também tem mostrado grande preocupação com a perda de espaço do PT nas cidades, conforme reportagem do Poder 360: “José Dirceu, que é uma dos maiores líderes na história do partido, também fez críticas à mobilização popular do governo. Ele disse que deveriam ter promovido campanhas sobre suas principais propostas, citando como exemplo o marco temporal de terras indígenas e a Reforma Tributária. Dirceu disse que o contrário se dá com a direita, que está, segundo ele, “ganhando a disputa político-eleitoral”, enquanto a esquerda perde territórios à medida que partidos do espectro político oposto se expandem. O ex-deputado citou PL –do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), PP, Republicanos, União Brasil e o PSD como exemplos de siglas que “estão ficando fortes” e criando novos diretórios pelo Brasil. A reorganização interna e mobilização das bases devem ser os maiores desafios do PT no ano eleitoral de 2024, segundo Dirceu. Ao mesmo tempo, o partido deve ponderar em quais cidades grandes e medianas deve investir esforços na campanha e apoiar candidatos de siglas aliadas. “Lula teve 60% dos votos em mais de 2.000 municípios, tem que eleger vereadores nessas cidades. Pelo menos 2 vereadores em cada. Depois temos que disputar em cidades médias e grandes e nos apoiar nos aliados e onde podem vencer”.
RONALDO CAIADO, VISLUMBRANDO BONS RESULTADOS NAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS, JÁ ARTICULA A CANDIDATURA PRESIDENCIAL. Maria Cristina Fernandes, como vimos anteriormente, não confia muito nas pretensões presidenciais do Centrão: “São partidos para os quais o lançamento de candidaturas presidenciais se tornou acessório. Preferem se concentrar nas disputas proporcionais porque é do Congresso que emana o poder que detêm sobre verbas eleitorais e partidárias e sobre as emendas parlamentares”. Tudo indica que Bolsanaro inelegível, deverá optar, na disputa presidencial de 2026, por uma candidatura presidencial mais orgânica que defenda o legado bolsonarista, como Tarcísio de Freitas ou Michele Bolsonaro; Romeu Zema e Ronaldo Caiado, como bem expressa o pastor Silas Malafaia, não são “bolsonaristas raiz” e sim “oportunistas”.(…) Mas vale registrar artigo de Tales Faria, do UOL, com os planos de Ronaldo Caiado: “A reunião da Executiva Nacional do União Brasil não selou apenas a decisão de afastar do cargo o presidente da legenda, deputado Luciano Bivar (PE). Serviu também como uma espécie de pré-lançamento informal da candidatura do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, a presidente da República em 2026. Deputados, senadores, governadores e prefeitos terminaram o encontro aos gritos de “Caiado presidente”, dando a entender que a aliança com Luiz Inácio Lula da Silva e o PT não resistirá à próxima eleição presidencial. Mas não é só o União Brasil que tem essa estratégia definida. O PP, do presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), já negocia a formação de uma federação partidária com o União Brasil. O presidente nacional do PP, senador Ciro Nogueira (PI), confirmou à coluna a negociação com o União Brasil. Ele acrescenta o Republicanos. Caso se juntem, os três serão não só a maior conformação partidária do país, como o legítimo representante de um grande centrão unificado, no Congresso e nas campanhas eleitorais. Têm hoje, ainda, os mais fortes candidatos a presidir as duas Casas do Congresso no ano que vem: Davi Alcolumbre (União-AP), no Senado; e os deputados Elmar Nascimento (União-BA) e Marcos Pereira (Republicanos-SP). Elmar e Marcos Pereira, por sinal, são os preferidos de Arthur Lira para a sua sucessão. Sob as bençãos de Lira, os dois fecharam acordo de apoio mútuo àquele entre eles que estiver mais bem colocado na disputa para presidente da Câmara. Lira se tornaria uma espécie de eminência parda da Casa após deixar o cargo. Da mesma forma que é hoje Davi Alcolumbre no Senado, após ter eleito Rodrigo Pacheco (PSD-MG) no comando da Casa. Caiado, no entanto, só começará a ter seu nome selado após as eleições municipais deste ano. A partir dali, União, PP e Republicanos poderão medir a força de cada um e definir o provável afastamento do governo do PT. Caiado é considerado o nome da vez do grupo para o Planalto em 2026 pelos seguintes motivos: O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que poderia ter o apoio do centrão, está inelegível; Como governador reeleito, Caiado não poderá permanecer no cargo a partir de 2026 e já anunciou o desejo de concorrer a presidente; Ele é tido como o governador mais bem avaliado entre os partidos de direita; O possível candidato ao cargo pelo Republicanos, Tarcísio de Freitas, tem dito que prefere disputar a reeleição como governador de São Paulo. Com tudo isso, os comandantes dos partidos do centrão acreditam que, após as eleições municipais, o grupo estará super fortalecido. Terão, segundo especulam, o comando do Congresso, a maior formação partidária do país e um candidato forte à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O PT e os partidos de esquerda que se cuidem!” (UOL, 19/03/2024).
A POLARIZAÇÃO É BOA PARA A OPOSIÇÃO, QUE É SEMPRE “FRANCO-ATIRADORA”; PARA QUEM É GOVERNO, COMO LULA, A POLARIZAÇÃO REBAIXA O “TETO DE APOIO” DO GOVERNO, O QUE PODE SER FATAL PARA A CONTINUIDADE POLÍTICA DA ESQUERDA. Àlvaro Garcia Lineira, sociólogo e ex-vice presidente da Bolívia, tem um diagnóstico muito preocupante para a esquerda latino-americana e também brasileira: “Atualmente, a América Latina tem, em sua maioria, governos de centro-esquerda ou de esquerda. A lista incluiu países que não faziam parte da primeira onda no início do século, como o México e a Colômbia. Entretanto, essa segunda onda parece estar muito longe de gerar uma hegemonia semelhante à que a esquerda tinha há uma década. Essa segunda onda progressista é fraca, não muito densa e, ouso dizer, temporária. Minha hipótese é que, nesses tempos liminares, teremos um progressismo de curta duração e um direitismo de curta duração. Hegemonias curtas, tanto à esquerda quanto à direita. Até que, em algum momento, o destino se realinhe para um lado ou para o outro e se inicie um longo ciclo de 20 ou 30 anos”.(Outras Palavras, 24/11/2024). Ou seja, mesmo com um grande presidente como Lula a reeleição em 2026 não é “favas contadas”. As pesquisas publicadas recentemente, com queda na aprovação do governo Lula, abriu um amplo debate sobre a melhor estratégia de enfrentar a extrema direita. Entendo que a polarização é boa para a oposição, que é sempre franco-atiradora; quem é governo é cobrado pela população pela “gestão” pelas entregas e avanços que consegue apresentar à população. A polarização, como no caso do governo Lula, rebaixa o teto de apoio do governo para próximo de 51%; não se consegue avançar sobre a base social da extrema direita, apoiadores mais de centro, com “chicote sobre as pessoas”. É preciso muita entrega e diálogo para subir a aprovação mais duradoura de Lula para o patamar de 60%, sendo 40% de bom e ótimo, que é o que transforma uma liderança praticamente imbatível nas eleições. Numa situação de grande equilíbrio entre o governo e oposição, qualquer variação no apoio ao governo, de forma pontual ou generalizada, coloca o governo numa situação difícil inferior a 50% de aprovação e, portanto, sem um favoritismo em disputas futuras contra a extrema direita.
CRESCE NO GOVERNO LULA O APOIO A UMA ESTRATÉGIA POLÍTICA MAIS AFIRMATIVA E MENOS “POLARIZADORA”. Marília Campos, prefeita petista de Contagem, já no programa de governo de sua candidatura, em 2020, trabalhou contra a extrema polarização política que temos no Brasil e fixou como objetivo de governo uma maior coesão social: “Marília diz que quem governa tem o dever de governar para todos, de promover a paz e o bem comum. Para Marília a democracia é a solução encontrada nas sociedades modernas para que diferentes interesses, ideologias e opiniões possam conviver pacificamente no dia a dia, e competir pela preferência da maioria nos momentos de eleição. Cada eleição escolhe aqueles que estarão no governo, mas também indica aqueles que serão da oposição, e ambos gozam da legitimidade do voto popular. Quem governa tem o dever de governar para todos, e não apenas para seus eleitores. Governar exige descer do palanque e transformar a competição do momento eleitoral em cooperação para a promoção do bem comum, celebrando pactos e construindo consensos. Governar não é produzir um permanente estado de guerra entre cidadãs e cidadãos. Governar requer amplitude, generosidade, civilidade e respeito pela cidadã e pelo cidadão que votaram contra o governante”.
Grandes lideranças do PT, como Fernando Haddad e José Dirceu, e importantes analistas políticos progressistas, defendem uma mudança de rumos do PT e do governo. Fernando Haddad em recente discurso no lançamento do programa “Pé de Meia”: “Nós precisamos voltar a sonhar no Brasil. Eu não tenho dúvida de que a construção desse sonho é o que vai curar esse país do ponto de vista espiritual. Nós ainda estamos muito divididos. Isso não é bom. Faz 10 anos que nós estamos divididos. Nós temos que nos unir em torno de um grande sonho e realizar o sonho de tantos brasileiros que querem um país justo, solidário e com progresso e desenvolvimento”.(…) José Dirceu em artigo no blog Outras Palavras: “Sem alarmismo, mas com responsabilidade, devemos avaliar nossa relação com as forças políticas, lideranças e setores sociais que votaram contra Bolsonaro e em Lula, numa perspectiva de defesa da democracia e de um programa que na campanha nos reuniu e nos deu a vitória. Essa aliança e esse diálogo têm de estar presentes no governo e na sua comunicação, sob pena de perdemos esse eleitor cidadão que nos deu a vitória. É preciso, em linguagem direta, uma transmissão entre a linha da campanha e a do governo, na comunicação e nas alianças políticas. Nos discursos e nos atos do governo. Governo é uma construção coletiva e sua relação interna e externa no Parlamento, nas demais instituições e na sociedade precisam expressar as alianças, inclusive no partido do presidente, o PT, que não pode se apresentar como uma voz discordante do governo sob pena de pagar um preço político alto. Um governo sem núcleo dirigente e sem equipe, que só depende do líder, do presidente, seguramente tem seus limites e custos. Manter a chamada polarização com o bolsonarismo tem um preço. É preciso ter cuidado para não ficarmos presos às bolhas do nosso eleitorado contra o dele. Vencemos porque conquistamos o apoio de cidadãos não petistas, progressistas, democratas. Temos de aprofundar essa aliança”.(…) Outra opinião muito interessante é de Alon Feuerwerker: “Sem subestimar a economia, tampouco é demais olhar para aspectos mais subjetivos dos mecanismos de produção de opiniões políticas. O capital político dos governos sempre se beneficia de dois pês: propósito e pertencimento. Quando está claro a que veio o governo, e quando ele passa a sensação de querer o bem de todo mundo, e não só de sua turma. Acirrar as contradições e estimular a guerra de todos contra todos pode ser útil para reforçar o poder momentâneo, mas um efeito colateral é produzir sensação de exclusão em áreas que o andamento da economia pode até, eventualmente, estar beneficiando. Por isso se diz que a política tem de andar de mãos dadas com a economia, para que a safra eleitoral não decepcione”.
José Prata de Araújo é economista.