O conceito de progresso nos municípios vem, consigo, carregado de um certo pré-conceito. Digo ao caro leitor e à cara leitora que este não era um trocadilho pretendido, embora tenha se tornado inevitável. Explico minha tese: nos acostumamos a ver governos contabilizarem o progresso como asfalto, cimento e números, muitos números! Longe de dizer que esses não sejam elementos importantes na melhoria das cidades, mas devo afirmar também que progresso, aquele que marca as pessoas, vai além de um conjunto de obras e intervenções urbanas e diz respeito à qualidade de vida que as pessoas têm em uma metrópole.
Vejo políticos que tentam puxar para si a pecha de moderninhos e eficientes usando um anacrônico discurso eleitoreiro que, felizmente, já não cai mais no gosto de muitos cidadãos e cidadãs. Eles criticam tudo o que permite que as cidades sejam espaços de convivência entre as pessoas. Enxergam como progresso apenas o cinza do concreto e o preto do asfalto – um conceito ultrapassado de cidade. Talvez não entendam que os espaços públicos e a ocupação deles pela população são também fatores importantes para se medir o progresso de uma cidade.
Vou agora para o nosso quintal. Durante décadas, Contagem teve negligenciada a política do encontro. A partir da implementação da Cidade Industrial, nos anos 1940, a ideia era que o município fosse uma espécie de depósito de fábricas e de trabalhadores operários que nelas atuavam. Era também um apêndice de Belo Horizonte, fornecendo parte da mão de obra do setor de comércio e serviços da cidade vizinha. Com o avanço desse processo, Contagem se tornou um município onde as pessoas dormiam, mas não viviam efetivamente. Qual o contagense que nunca ouviu a mãe ou a avó falar que ia à cidade, referindo-se a Belo Horizonte?
A cidade não se preocupava com as experiências sensoriais do cidadão dentro de seus limites geográficos e isso refletia na sensação de pertencimento das pessoas. Toda e qualquer programação que envolvesse o “consumir a cidade” era feita em Belo Horizonte. As praças, os parques, os shows… Tudo estava na capital – tão perto e ao mesmo tempo tão longe de Contagem para aqueles que se aventuravam a voltar para casa após os eventos à noite e nos fins de semana. Embora já fosse gigante, Contagem não se preocupava com uma importante tríade: trabalhar, estudar e viver.
Foi preciso que Marília Campos chegasse ao poder, em janeiro de 2005, para que essa perspectiva mudasse. Do limão, ela fez uma limonada. Ou melhor, da abóbora, fez um doce. Pegou a abóbora, modo pejorativo pelo qual Contagem era conhecida, e a transformou numa marca, num símbolo da cidade. Criou um festival gastronômico e um personagem lúdico, que, a meu ver, foram uma espécie de guinada na perspectiva do cidadão viver o dia a dia de sua cidade. Neste ano, a cidade terá seu 17° festival. E onde esse festival sempre ocorre? Nas praças da cidade, reformadas e revitalizadas a partir dessa visão de cidade que Marília tem.
A “Marília das Praças”, maneira debochada como era chamada a então prefeita, mostrou na prática porque era importante qualificar o espaço urbano. As praças de Contagem deixaram de ser pontos de uso e tráfico de drogas. No lugar do perigo, da escuridão e do vandalismo, vida! As pessoas passaram a frequentar o espaço público e passaram a ajudar a cuidar daquilo que é de todos. Aqueles que tentaram imputar a Marília uma alcunha negativa saíram com um nó interessante que ela conseguiu dar nos críticos de plantão que ainda pensavam que Contagem era vocacionada a ser eternamente um grande dormitório de Belo Horizonte.
A grande verdade é que a ocupação dos espaços públicos da cidade gerou uma onda de pertencimento ao cidadão contagense, historicamente carente de atrações interessantes na própria cidade. Shows, festas e festivais tomaram conta dos espaços públicos, sempre de maneira gratuita e democrática. Enfim, o cidadão contagense consumia a cidade. Os empresários viam que valia a pena abrir bares, os feirantes perceberam que poderiam fazer as mais deliciosas guloseimas em suas barraquinhas… A cidade ganhou vida própria.
Após a pandemia, já num terceiro mandato recheado de aprovação popular (todas as pesquisas apontam percentuais acima dos 70%), Marília fez a cidade retomar essa vocação adormecida por tantos anos. Quando se diz que Contagem está feliz de novo, não é apenas um elemento retórico que remonta à vitoriosa campanha de 2020. Significa que a cidade está viva e vibrante. Significa que, novamente, Contagem tem vida própria com atrações que mexem com as pessoas.
Alceu Valença, João Gomes, Frejat… Tudo isso num intervalo de pouco mais de um mês. Isso sem falar na valorização de atrações locais como João Marcos e Maurinho e Poliane Lins. Sem citar ainda peças de teatro de graça para a criançada no Parque Fernão Dias, no festival Contagem Geek, referência da cultura pop, no incentivo a bandas locais com estúdio de gravação na Estação Juventude, editais para artistas e produtores contagenses… São exemplos rápidos de uma cidade que valoriza a própria cidade e a convivência dos cidadãos.
Expliquei todo esse contexto para, enfim, voltar ao começo deste texto. Progresso não se mede apenas por viadutos, trincheiras, asfalto… Progresso se mede também por sensação de pertencimento. A cultura dá retorno. Não são “apenas shows”. Investir na cultura é ver uma cidade mais plena, identificada consigo mesma e com sua história. Investir na cultura é tornar o cidadão protagonista da ocupação pacífica dos espaços públicos.
E é possível investir sim, em atrações e na requalificação dos espaços públicos, sem deixar de lado os investimentos prioritários em outras áreas. Contagem gasta 30% de sua receita com saúde. Investe perto desse percentual na educação. Tem um robusto plano de 550 obras, que soma R$ 1,5 bilhão. Mas Contagem entende também que uma cidade feliz é a soma de tudo isso numa cidade em que se possa viver, trabalhar, estudar e sonhar com dias melhores.
Rodrigo Freitas é jornalista e, atualmente, subsecretário de Comunicação de Contagem.